“Inicialmente,
peço desculpas por estar ousando tentar responder a perguntas
que, certamente, durante muitos e muitos anos, ainda estarão
dividindo as opiniões especializadas a respeito do assunto.
Entretanto, a faixa etária, e a absoluta independência
com relação a qualquer grupo econômico, político,
pedagógico ou religioso permite-me externar minha modesta
posição sobre uma das grandes dúvidas do
ser humano: onde começa a vida? No intuito de facilitar
a resposta, vou discutir, tão somente, o início
da vida biológica, sem ingressar nas discussões
filosóficas a respeito da imprescindibilidade de interações
psicoafetivas do ser biológico com o ambiente que o cerca
e vice-versa.
Assim, o art. 2º do Código Civil vigente destaca:
“A personalidade civil da pessoa humana começa do
nascimento com vida, porém, a lei põe a salvo todos
os interesses do nascituro desde a concepção”.
O momento da concepção, ou seja, o encontro do espermatozóide
com o ovócito secundário, com a união dos
cromossomos maternos e paternos representa a constituição
do arsenal genético biológico que, relacionando-se
com o meio ambiente que o cerca, dará origem ao futuro
ser humano, com as virtudes e defeitos que todos possuímos.
É desta estrutura resultante da concepção,
a mais simples, e a mais completa, totipotente, que toda a seqüência
futura dependerá. Cada momento seguinte do desenvolvimento
humano, é decorrente da potencialidade da estrutura genética
inicial. Todas as demais discussões, com evidentes focos
estranhos à expressão “origem da vida”,
utilizam premissas, evidentemente falsas, para chegar às
conclusões que desejam.
Assim, os advogados criminalistas, doutrinariamente, aproveitando
a curiosa falha da legislação penal que “não
define o crime de aborto”, entendem que o aborto é
a interrupção da gravidez, a qualquer tempo, e que
a gravidez começa no momento da fixação embrionária
(nidação).
O artifício desta curiosa conclusão jurídica
permite que, de qualquer modo, se mate o embrião humano,
desde que o fato ocorra antes da nidação.
Desta forma, o DIU, com ou sem cobre e as denominadas “pílulas
do dia seguinte”, podem ser vendidos livremente no País,
eis que, conforme esta “definição” jurídica,
não são abortivas.
Entretanto, também não podem ser chamadas de exclusivamente
“anticoncepcionais”.
Ora, se até mesmo os juristas da área criminal,
informam que a partir da nidação já se pode
punir o agente por crime de aborto, e o delito de aborto é
classificado como crime contra a vida, com mais certeza, o aparecimento
de funções cardíacas estará em um
estágio posterior à nidação.
Quanto ao aparecimento das funções cerebrais, o
foco da discussão muda inteiramente.
Se discutirmos a presença das funções cerebrais,
já não estaremos mais discutindo a vida em nível
exclusivamente biológico. Agora, inúmeros outros
conceitos filosóficos precisam ser apresentados para que
a discussão tenha alguma base científica que sirva
de norte nas discussões.
E esta discussão, tenho certeza, persistirá por
muitos anos. Entretanto, conforme as conveniências da modernidade,
sem qualquer dúvidas, surgirão correntes que, de
alguma forma, explicarão que o começo da vida será,
gradativamente, empurrado para mais tarde, para mais longe da
concepção, no sentido de permitir a utilização
das células embrionárias nos procedimentos de terapia
genética.
Uma rápida viagem a um passado não muito distante,
considerando a existência do ser humano na Terra, vai mostrar
que, ao longo da história, já houve diversos momentos
considerados decisivos para marcar o início da vida. Santo
Tomas de Aquino, na idade média, ensinava que a vida humana
começava no momento em que a alma ingressava no corpo.
Isto ocorria por volta dos quarenta dias no homem, e aos oitenta
dias na mulher. Com essa estratégia pedagógica,
muitas freiras, estupradas, não cometiam pecado ao provocar
o aborto, pois, o produto da concepção ainda não
tinha vida humana.
Modernamente, biologicamente, acredita-se que a vida humana só
começa a partir dos 14 dias. A explicação
para esta conclusão é o aparecimento da linha primitiva,
no embrião, que insinua a formação do sistema
nervoso central do ser humano. Entendem os defensores desta teoria
que o ser humano não é apenas um conjunto de células
biologicamente estruturadas. É considerado indispensável
que possua um sistema nervoso central e, o que se admite indispensável,
um cérebro pensante.
É a partir desta “decisão” pedagógica
que se estruturou a lei 11.105 de 2005, a denominada lei da Biossegurança,
que normatiza os procedimentos a respeito das denominadas células-tronco
embrionárias. Chega-se ao cúmulo de chamar os embriões
humanos, com menos de 14 dias, congelados em laboratórios
de fertilização assistida, de pré-embriões.
Perceba a estratégia pedagógica: não são
embriões; são pré-embriões.
A partir destes conceitos, agora respaldados na “lei”,
os pré-embriões humanos não devem ser implantados
em mulheres após três anos de congelamento em laboratório.
Assim, após este tempo, podem ser descartados. Ora, se
vão ser descartados, jogados no ralo, em nome da dignidade
do ser humano, e para tentar atender a tantas pessoas que necessitam
de esperança para seus males degenerativos, estes “pré-embriões”
humanos, com células multipotenciais, após três
anos de congelamento, podem ser manipulados em experiências
de terapia genética.
Curiosamente, estas experiências, só agora “legalizadas”,
certamente, estão sendo realizadas em todo o mundo.
Assim, partindo da tradicional análise custo x benefício,
pondo em jogo a ponderação dos interesses em jogo,
poucos serão os que defenderão o embrião
humano, discreto grupo de células, sem qualquer envolvimento
afetivo com seus pais, ou interessados em suas células,
diante da esperança de que suas células, implantadas
em algum ente querido doente, desenganado pelos médicos,
poderia recuperar a saúde e a qualidade de vida.
Diante destas esperanças, promessas e acentuadas controvérsias
jurídico-penais, religiosas e técnico-científicas,
ficará, cada vez mais difícil, alguém defender
a idéia de que a vida humana começa na concepção.
Apenas para encerrar, faz parte do cotidiano da medicina especializada
a técnica de redução dos embriões
excedentários nos procedimentos de fertilização
assistida. Curiosamente, se você quiser pensar a respeito,
os embriões humanos já estão implantados
no útero materno, ou seja, já estão nidados.
Entretanto, como a implantação foi muito bem sucedida,
há conceptos em demasia no interior do útero. Assim,
no interesse da gestante, e para uma maior expectativa de êxito
na gestação em curso, o médico, apoiado pela
gestante, e por seus familiares, faz a “redução
embrionária”, isto é, mata um, ou dois, ou
três dos embriões humanos já implantados.
Será que a lei brasileira autoriza este tipo de aborto?
Ou será que isto não é um aborto? Ou será
que os interesses científicos e dos familiares podem ser
praticados ao arrepio da lei?
São situações que, a cada dia, ocupam as
salas de cirurgia, os consultórios médicos, as salas
de aula, os modernos laboratórios de pesquisa científica
e, tudo isso, sob os olhos preocupados dos megainvestidores relacionados
a grandes grupos farmacêuticos e empresariais.
Quem ousará defender a singela observação,
evidente por si só, cristalina como a água de rocha,
de que a vida humana começa com a concepção?
Olhe ao lado e veja pessoas em cadeiras de rodas, tetraplégicos
imobilizados em um leito hospitalar, cardiopatas incapacitados
de executar os menores esforços e, diante deles, a esperança
de contar com as células-tronco de um embrião humano,
inteiramente desconhecido, de futuro inimaginável, talvez
Einstein, quem sabe Hitler. Você deve decidir se aquele
embrião já tem vida humana, ou se, ao contrário,
é apenas um grupo inerte de células totipotenciais.
Temo, porém, discutir o assunto em termos éticos.
Seria preciso, inicialmente, estabelecer qual a ética a
ser discutida: utilitária, hedonista, deontológica
etc. Predominando a ética utilitária, a vida humana
começará, cada vez, mais distante da concepção
e, cada vez mais, necessitará de respostas psico-afetivas
com o meio ambiente.Se aplicarmos a ética deontológica,
ou a ética canônica, a questão será
respondida afirmativamente. Se utilizarmos a ética utilitária,
se olharmos em direção às pessoas incapacitadas
por doenças degenerativas e pensarmos na esperança
que estas células-tronco embrionárias, provenientes
de um embrião humano que será morto, poderão
trazer para os desenganados, não veremos qualquer ferimento
ético.
Como já expliquei, estes procedimentos só poderão
ser realizados com alguma aceitação popular, depois
que os “pensadores” colocarem na cabeça da
população comum que o embrião ainda não
tem vida humana, que há necessidade de adequada interação
psicoafetiva do ser humano com o meio ambiente, que o anencéfalo
não é um ser humano, que determinadas anomalias
genéticas não compatíveis com a vida humana
não permitem que o indivíduo seja considerado ser
humano etc.
Inicialmente, será necessário implantar na cabeça
da população determinados conceitos para, mais tarde,
“naturalmente” surgirem as decisões “científicas”.
A população, certamente, aplaudirá.
A Igreja, por último, quando perceber que nada poderá
fazer para impedir este percurso progressivo da ciência,
irreversível, encontrará alguma forma de ajustar-se
à nova realidade para, com sempre, conseguir sobreviver.
Não se esqueça que vivemos em um País onde
a legislação diz uma coisa e, como sabemos, diariamente,
a todo instante, faz-se coisas inteiramente dissociadas da lei,
como se nada de errado estivesse acontecendo”.
|
|
"Sobre
onde começa a vida “há que distingüir
o ponto de vista do Biólogo e do Jurista.
Para
o Biólogo, a vida está presente nas células.
Assim, os próprios gametas que vão produzir um
zigoto (ovo fertilizado) são entidades vivas. Do ponto
de vista jurídico, qual é o estágio quetem
direitos constitucionais?
Em geral, os juristas ponderam que somente o indivíduo
que nasce é que tem direitos constitucionais.Por outro
lado, a área cinzenta é aquela que envolve o embrião.
Os que são contra o aborto, o que pode incluir juristas,
Biólogos e religiosos, acham que é anti-ético,
ou até mesmo criminoso,interromper a gestação.
Houve veto somente à pesquisa com células tronco
embrionárias e não com as células-tronco
maduras (hematopoéticas). Na minha opinião, essa
foi uma medida um tanto míope, pois é a célula-tronco
embrionária que realmente pode ter mais utilidade em
aplicações médicas. A priori não
tenho objeção alguma à pesquisa com células-tronco
embrionárias.
A manipulação dessas células não
deve ser considerada como um procedimento anti-ético
uma vez que a blástula (etapa do desenvolvimento embrionário
que é a fonte das células-tronco embrionárias)
é um conjunto de células que ainda não
possui a organização encontrada no indivíduo
formado. Assim, pode-se concluir com base na ausência
de um sistema nervoso formado, que essas células não
só não possuem consciência, como também
não sentem dor e de uma maneira geral não demonstram
ter muitas interações com o ambiente. Seria o
mesmo que afirmar que fazer pesquisa com células em cultura
(uma abordagem amplamente utilizada em milhares de laboratórios)
é anti-ético”.
|