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“Primeiramente
é preciso estabelecer uma diferença fundamental:
existem as pesquisas com animais (área básica) e
as pesquisas com seres humanos (área clínica). Os
comitês de ética em pesquisa são mais severos
com os trabalhos que envolvem animais do que os que envolvem humanos.
Mas a priori, todo tipo de pesquisa que necessite de testes em
seres vivos precisa passar pelo crivo desses comitês para
ser aceita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA). Além disso, os pesquisadores são obrigados
a certificar que o trabalho foi aprovado pelos comitês para
poder publicá-lo ao nível internacional.
Outra questão a ser comentada é que a ética
de pesquisa caminha muito devagar no Brasil. Apesar dos avanços,
nossa instituição não está preparada
para submeter todos os trabalhos aos comitês e nem temos
essa cultura de nos subjulgar a ele. É importante que o
trabalho desses comitês seja menos burocratizado e mais
acessível.
Para que esse esquema funcione, é preciso que os comitês
de ética em pesquisa divulguem mais a sua existência
junto aos pesquisadores. Não sabemos nem quantos existem,
nem em quais áreas estão atuando, ou o que devemos
fazer para inscrever nossas pesquisas. O ideal é que cada
unidade tenha um comitê de ética específico,
e que ele ofereça orientações especializadas,
como o número de indivíduos que devem ser submetidos
aos testes clínicos, e o tempo necessário à
exposição às drogas, por exemplo.
A função e a composição dos comitês
também são assuntos que deveriam ser discutidos
com os pesquisadores de cada unidade. Um comitê deve ser
composto por pessoas capacitadas, flexíveis, distintos
representantes da sociedade. É importante pensar nos responsáveis
por aprovar o comitê e seus membros. Tem que haver um colegiado
para aprová-lo e o pesquisador deve ter a possibilidade
de recorrer caso não concorde com o que ficou decidido
pelo comitê de ética.
De qualquer forma, sua atuação é válida,
pois força o pesquisador a ter mais cuidado quanto a elaboração
de seus projetos. A existência institucional dos comitês
em si é obrigatória, mas eles devem ser vistos como
auxiliadores e não como carrascos. Se deixarmos de desenvolver
um medicamento em função de questões burocráticas
ou porque determinado grupo não concorda com uma linha
de pesquisa, outro país o fará; perderemos a patente
e teremos que importar um medicamento que tínhamos plenas
condições de desenvolver.”
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“Surgida
da reação mundial às atrocidades cometidas
pelos nazistas de Hitler em nome de uma pseudo-Ciência
Médica é inegável que o já consolidado
movimento internacional por revisões éticas preliminares
e independentes dos protocolos de pesquisas envolvendo seres humanos,
representa inestimável e irreversível avanço
para a Humanidade.
Ao contrário de outros países, no Brasil, só
mais recentemente esta louvável prática foi institucionalizada,
passando a ser obrigatória com a promulgação
da Resolução n°196/96 que instaurou os Comitês
de Ética em Pesquisas (CEPs) para revisão ética
local das pesquisas com seres humanos, e em alguns casos e sob
certas condições, sujeitas adicionalmente a aprovação
final pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisas (CONEP).
Como a questão da ética em pesquisas com seres
humanos, envolve primordialmente princípios morais, filosóficos
e políticos, torna-se inquestionável, portanto,
o obrigatório caráter multiprofissional dos comitês
revisionais. Isto não impede, porém, que nas discussões
os especialistas possam, e devam mesmo, assumir um caráter
isento de fornecedor de detalhes e peculiaridades técnicas.
Não me parece haver correta percepção por
exemplo, de que não seria de modo algum lícito,
muito menos democrático, cercear o direito dos cidadãos
enfermos capazes e/ou seus responsáveis de candidatarem-se
a novos tratamentos experimentais para suas moléstias.
Desde que suficiente e adequadamente informados dos possíveis
riscos e desconfortos envolvidos, com a garantia da aplicação
prévia de um competente Termo de Consentimento Informado.
Riscos paralelamente assumidos e permanentemente monitorados
durante o andamento da pesquisa, se preciso com auditorias,
pelo Comitê co-responsável.
Tal equívoco tem levado a uma ilegítima obstacularização
e desestímulo ao esforço de pesquisa, o que é
pior muitas vezes nacionalmente empreendido, para contínuo
desenvolvimento de novas terapêuticas e/ou aperfeiçoamento
das existentes para portadores de enfermidades graves e incapacitantes
com mau prognóstico. Para as quais ainda não existam
recursos terapêuticos universalmente reconhecidos como
razoavelmente seguros e/ou eficazes, como a Esquizofrenia e
Transtorno Afetivo Bipolar.
Somente a comparação com o placebo, respeitados
os princípios éticos e humanísticos da
pesquisa com Seres Humanos pode nos dar a correta dimensão
em termos absolutas da eficácia e/ou segurança
de um novo tratamento. Isto também parece não
ter sido ainda adequadamente acordado nas instâncias nacionais,
a julgar pela sistemática reprovação dos
protocolos de estudos que envolvam grupo-placebo, ainda que
ao lado de grupo controle submetido randômica e cegamente,
ao melhor tratamento existente.
A inexistência de tal consenso tem levado os promotores
internacionais dos estudos com novos tratamentos, particularmente
a Indústria Farmacêutica, a dirigir seus esforços
para outros países que não o nosso, que notoriamente
já sofre desproporcionalmente de baixa aplicação
de financiamentos na área com prejuízos definitivos
para o desenvolvimento de excelência em pesquisa médica.
Tudo isto nos recorda uma outra questão capital. Qual,
idealmente, deveria ser o grau de participação
do Estado (Governos) na provisão/fiscalização
das garantias humanisticamente obrigatórias na pesquisa
com seres humanos, lembrando que em muitos países, tal
questão não é objetivo de legislação/fiscalização
ou controle estatal, ficando inteiramente a cargo das instituições
locais, no máximo com instâncias revisionais regionais.
Não creio que tal modelo deva ser visto, acriticamente,
como desejável/aplicável para nosso país,
mas que talvez possa nos levar a um aperfeiçoamento de
nosso modelo que pelo que se vê tem sido pelo menos um dos
responsáveis pelo notório esvaziamento do já
pequeno movimento nacional de pesquisas médicas envolvendo
seres humanos.” |