Argumento
09.03.2006
Clareza e sensatez na Biomedicina
por Mariana Elia
 
A professora-adjunta e chefe do laboratório de biomedicina do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho é um exemplo de sensatez no meio científico. Eliane Volchan, pesquisadora e especialista no estudo sobre a emoção, falou dos perigos de experimentos mal preparados e sobre a mulher na ciência.

Por muito tempo, sua pesquisa era embasada por experimentos com animais. Recentemente, passou a estudar o campo da emoção em humanos. Não apenas o enfoque no processamento cerebral das atividades emotivas, mas, principalmente, na reação funcional do corpo. Aspectos como sudorese ou tempo de reação são medidos nos experimentos, que avaliam através também de respostas verbais dos voluntários. Sua linha busca os traços mais básicos do ser, “contextos que lembrem dos sistemas de motivação mais primitivos, ao invés de estudar inveja ou vaidade”, mesmo sabendo que se trata de uma simplificação, pois sempre há uma modificação de acordo com o meio e com uma propensão individual. O ideal é chegar a uma avaliação com “medidas fisiológicas que já foram relacionadas a traços individuais”. Um aspecto bastante interessante no estudo da professora é o caráter visual. Segundo ela, grande parte do cérebro humano processa imagens – “é um dos sentidos mais bem representados” - e, por conta disso, seus experimentos são freqüentemente com fotos ou imagens, divididas em neutras, positivas e negativas, a fim de avaliar como o voluntário responde a tais exposições (os estímulos negativos, por exemplo, retardam a resposta corporal, ao contrário de estímulos afetivos, que parecem ter um processamento facilitado).

A questão de diferença de gênero não está no centro de sua pesquisa, mesmo que surjam eventualmente algumas perguntas a ela relacionadas, já que o objeto de pesquisa está presente em ambos os sexos. Para a pesquisadora, “tem um problema muito sério com esse enfoque”, pois todo experimento é feito por uma linha, um ponto de vista, que todos têm, inclusive o pesquisador “e o viés para gênero é muito grande, a gente está inserido em uma sociedade com viés bastante explícito”. Esse ponto pode, portanto, direcionar uma pesquisa de gênero de maneira que apenas confirme um estereótipo ou um preceito sem trazer um dado legitimamente científico. Eliane dá o exemplo de uma pesquisa norte-americana, que, nos anos 60, provocou muita discussão, pois constatava que os negros tinham menos capacidade intelectual que os brancos. Na verdade, as questões do experimento eram relativas ao mundo dos estudantes de Harvard, ou seja, estavam inseridas em um meio que os negros em sua maioria não tinha acesso. Assim, para ela, é preciso ver com muita atenção esse ponto para que tais estudos produzam respostas científicas e não apenas especulações.

Inclusive porque as conseqüências dessas interpretações no meio científico são muito importantes para uma maior inserção ou exclusão da mulher na área. Ainda que venha diminuindo a diferença com os anos, o espaço das mulheres no mercado de trabalho ainda não se equipara ao dos homens. Diversas organizações são articuladas em nome da maior presença feminina nos laboratórios e centros médicos. O evento das Mulheres Latino-americanas nas Ciências Exatas e da Vida é um exemplo dessas articulações, e a professora Eliane Volchan participou do primeiro em 2004. Esse ano é a vez da professora Cláudia Vargas, também professora e pesquisadora do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, que participará do Brain awareness week, uma semana dedicada somente à divulgação de estudos sobre o cérebro e com presença apenas de mulheres. É esse caminho que a professora Eliane aposta, mais seguro e vantajoso para o avanço da ciência.

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