Faces e Interfaces
18.08.2005
Cirurgia contra a obesidade
por Taisa Gamboa


Desde 1998, a medicina oferece uma forte arma contra a obesidade, a cirurgia bariátrica. A técnica começou a ser implantada na UFRJ em 2002, e conheceu seu boom mundial no ano seguinte. Na luta contra balança, existem três tipos de operação, que são indicadas conforme a situação de cada paciente.

Embora seja aclamada por alguns médicos, esta cirurgia não consegue alcançar resultados efetivos sem o apoio de profissionais da nutrição, educação física e psicologia, por exemplo. Além disso, a cirurgia bariátrica expõe os pacientes aos riscos de uma operação.

Muitos profissionais de saúde são a favor desta técnica, mas existem outros com ressalvas a fazer. Para conversar sobre este tema o Olhar Vital convidou o clínico e endocrinologista do Programa de Cirurgia Bariátrica do Hospital Universitário da UFRJ, João Regis Carneiro, e a professora adjunta do setor de nutrição clínica do Instituto de Nutrição da mesma universidade, Glorimar Rosa.




João Regis Carneiro

Glorimar Rosa

"Sempre trabalhei com a obesidade. Fiz minha tese de mestrado sobre este assunto. É um tema que sempre me fascinou em função de como a doença é vista. Os obesos são tratados como preguiçosos, mas a obesidade é uma doença que está relacionada a vários fatores, tais como o estresse, problemas familiares e financeiros.
Para se ter uma idéia, nos últimos 20 anos, a obesidade cresceu em praticamente todo o mundo, e quase dobrou no Brasil. Temos mais obesos que desnutridos, no nosso país como um todo. Em 1992, os EUA realizaram 16 mil operações do tipo. Já em 2003, foram cerca de 113 mil casos. O Rio de Janeiro possui 40 mil obesos mórbidos que não são operados em função de questões políticas governamentais.

A cirurgia bariátrica surgiu, em virtude dos poucos resultados obtidos apenas com a nutrição. Não mais que 2% dos obesos que emagrecem com dietas conseguem manter o peso após cinco anos. Além disso, não existe nenhuma perspectiva de surgimento de um medicamento revolucionariamente eficiente contra esta doença a ponto de controlá-la por completo.

Trabalho com a cirurgia bariátrica há seis anos e acabei trazendo a técnica para o Hospital Universitário, que atualmente opera de um a três pacientes por mês. Já acompanhei mais de 600 pacientes, 90 só no HU.

É bom lembrar que a cirurgia não é instrumento de cura, ela possibilita a melhora da situação do paciente, desde que ele esteja comprometido com o tratamento como um todo, o que inclui a reeducação alimentar e a atividade física.

Além do bom preparo do paciente, a operação exige boa indicação, além da técnica cirúrgica adequada. Como a obesidade é um problema social e está relacionada a diversos fatores, há a necessidade de um atendimento completo. A equipe do Programa de cirurgia Bariátrica do HU engloba mais de 15 pessoas: três clínicos, dois cardiologistas, um fisiatra, um fisioterapeuta e sua equipe, profissionais de educação física, dois nutricionistas, uma assistente social e um psiquiatra. Todos se reúnem uma vez por semana para discutirem os casos e sempre deve haver consenso sobre a viabilização da operação em cada paciente. Esta equipe possui vários trabalhos publicados no Brasil e no exterior. O tratamento multidisciplinar é fundamental no pré-operatório, pois auxilia na redução dos riscos da cirurgia, já que os pacientes apresentam, em geral, outras doenças.

Não há necessidade de correr para a mesa de cirurgia. A operação nunca é a primeira opção. Quando um paciente chega ao estágio da operação, ele já passou por vários outros tratamentos e não obteve sucesso. São pessoas frustradas. Raros são os pacientes que conseguem emagrecer vagarosamente apenas com dieta e seguem este caminho a longo prazo sem o auxílio da cirurgia. O emagrecimento pré-operatório é estimulado para que o paciente entre no clima da transformação e abrace a nova idéia. Além disso, o tratamento exige manutenção permanente".

"A obesidade é definida como uma condição de acúmulo excessivo de lipídios no tecido adiposo, contribuindo para o surgimento de diversas co-morbidades, principalmente, as dislipidemias, diabetes mellitus do tipo 2, doenças vasculares oclusivas, hipertensão arterial, resistência insulínica, doença do refluxo gastroesofágico, apnéia do sono, doença coronariana, distúrbios osteoarticulares, alguns tipos de cânceres, além de depressão e problemas de adaptação social.

É, atualmente, um dos mais graves problemas de saúde pública, o que tornou a doença uma epidemia global, independente das condições econômicas e sociais. E por se tratar de uma doença de etiologia multifatorial, o tratamento da obesidade envolve diversos tipos de abordagens, sendo o tratamento convencional constituído, principalmente, pela reeducação nutricional, além da realização de atividade física e terapia comportamental.

A obesidade é fortemente influenciada por fatores ambientais, mas já é reconhecida a influência genética da gênese dessa doença, que resultaria num menor gasto energético e no aumento do apetite. Na literatura científica, já temos descritos mais de 250 genes envolvidos na ocorrência da obesidade.

Mediante a complexidade da etiologia, o tratamento convencional dos super obesos (Índice de Massa Corporal - IMC maior ou igual a 40 kg/m2) tem apresentado um baixo índice de sucesso, sendo muitas vezes necessária a utilização de fármacos para controlar a compulsão alimentar do paciente.
Atualmente, muitos pesquisadores têm apontado a cirurgia cariátrica como um tratamento eficaz para a redução do peso corporal. No entanto, esse procedimento cirúrgico pode levar a complicações a curto e longo prazo, podendo comprometer seriamente a saúde do paciente. Além disso, o efeito benéfico da cirurgia bariátrica dependerá do acompanhamento nutricional e clínico no período pré e pós-operatório, pois esse tipo de intervenção cirúrgica promove deficiências nutricionais, comprometimento do sistema imunológico, problemas psicológicos - podendo gera quadros de anorexia ou bulimia nervosa.

A eficácia do tratamento da obesidade depende da mudança do estilo de vida, ou melhor, deverá contemplar mudanças de hábitos alimentares, a realização de atividade física e apoio psicológico - para melhor da auto-estima. Sem essas mudanças qualquer tipo de intervenção terá um resultado positivo temporário e uma "eficácia" enganosa.

Sem dúvida, devemos privilegiar o controle alimentar, ao invés de expor o paciente à cirurgia. A primeira opção para o tratamento da obesidade é a mudança de estilo de vida, incluindo a mudança dos hábitos alimentares, pois esta é a base desse tratamento. Sendo a forma mais saudável e de resultados mais duradouros, quanto a manutenção do peso alcançado.

O tratamento psicológico é muito importante para o controle da compulsão alimento, assim como, a melhora da auto-estima. A maioria desses pacientes tem uma história de vida triste e, buscam encontrar prazer ou esquecer os problemas, uma forma de escape, ou compensação das suas frustrações, traumas, problemas de adaptação social ou familiares, ou outros problemas emocionais, através da compulsão alimentar (sua única fonte de prazer ou "castigo").

A terapia seja em grupo, familiar ou individual os ajuda a reconhecer o alimento como fonte de energia para manutenção de uma vida saudável e não como uma compensação dos seus sofrimentos".