No início, planos
de saúde com tabelas de custos baseadas na probabilidade genética
de cada paciente de desenvolver doenças de tratamento caro. Depois,
uma sociedade dividida a partir das características físicas
e comportamentais determinadas pelos genes de cada indivíduo. Acredite,
hoje, isso não é mais só ficção científica.
A partir do Projeto Genoma Humano, iniciado em 1990, com a participação
de pesquisadores de vários países e o objetivo de mapear
geneticamente o ser humano, as portas se abriram para uma série
de mudanças em nossa sociedade, que se vê diante de um elemento
novo, ainda que determinante, na sua existência. Ao mesmo tempo,
as pesquisas e os conhecimentos gerados fazem aflorar questões
éticas para a ciência em sua relação com a
sociedade, que se vê diante da necessidade de escolher que caminhos
devem ser tomados e quais devem ser deixados de lado.
Em estudo divulgado
recentemente, pesquisadores diziam ter localizado um gen que determinaria
o comportamento homossexual nos homens. Apelidaram-no de "gay gene".
Não é a primeira vez que se tenta ligar comportamentos humanos
a determinantes genéticos. Já se anunciou, por exemplo,
o gen da esquizofrenia e já se correlacionou agressividade a pessoas
com uma anomalia nos cromossomos. Mas até que ponto é possível
ver a genética como um fator tão determinante do comportamento
humano? Quão importante não é, também, o ambiente
em que o indivíduo se desenvolve? Para o professor Franklin Rumjanek,
do Departamento de Bioquímica Médica da UFRJ, os dois elementos
se complementam na determinação do comportamento de cada
um. "É preciso dosar aquilo que a genética diz com
a influência do ambiente em que a pessoa é criada e vive.
Além do mais, pesquisas como essa [do gay gene] normalmente se
baseiam em apenas um gen, quando é provável que um comportamento
tão complexo quanto a opção sexual seja resultado
de uma combinação de vários genes, e da relação
entre eles e o ambiente", diz o professor.
Franklin Rumjanek, é responsável pelo laboratório
Sonda UFRJ (que faz exames de DNA para verificação de paternidade),
e acredita na possibilidade da sociedade ser estratificada pela genética.
"Saber de antemão quais são as doenças a que
um paciente tem predisposição é de grande interesse
para as seguradoras, por exemplo", argumenta. Nesse caso, algumas
pessoas pagariam apólices mais caras, se estivessem no grupo de
risco. Ele lembra que, no caso de algumas doenças degenerativas,
já é possível saber quem pode ou não desenvolve-las.
"Da mesma forma, algumas empresas podem contratar somente pessoas
saudáveis, que não sejam predispostas a desenvolver nenhuma
doença grave", diz ele. Assim, é possível imaginar,
em algum tempo, exames de DNA fazendo parte do processo seletivo de grandes
companhias.
Para o professor Rumjanek, em breve o mapeamento genético para
detecção de aptidões atléticas, artísticas
ou intelectuais irá aquecer as discussões sobre a democratização
do acesso a essas áreas.
Quanto a definição de raças, professor Franklin diz
que os geneticistas ainda não conseguem definir a etnia de alguém
pelo seu genoma. "É possível ter alguns indícios,
mas não dizer com certeza. Mas isso pode vir a acontecer",
diz.
Franklin diz
que as discussões éticas a respeito do uso do conhecimento
sobre o genoma humano não levarão a uma limitação
das pesquisas por algum elemento controlador. Para ele, existem elementos
que são condenáveis e vão continuar sendo, como a
pesquisa envolvendo humanos. Outros pontos merecem ser discutidos, é
o caso do uso de embriões nas pesquisas. "Quem dá a
direção que a ciência deve tomar é a própria
sociedade, a opinião pública. As leis aparecem depois, como
uma forma de normatizar o consenso comum", diz o professor.
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