• Edição 270
  • 29 de setembro de 2011

Faces e Interfaces

Fluoretação da água e saúde

Louise Rodrigues

No Brasil, ao contrário de vários outros países, a fluoretação da água é obrigatória em todas as cidades. Esse requisito foi promulgado através da lei nº 6050, de 24 de maio de 1974. Tal lei é apoiada pelas cinco entidades profissionais de odontologia de âmbito nacional: Conselho Federal de Odontologia, Associação Brasileira de Odontologia, Federação Nacional de Odontologistas, Associação Brasileira de Ensino Odontológico e Academia Brasileira de Odontologia.

Foram estas entidades que, em 1988, subscreveram um documento nacional pró-flúor, classificando a fluoretação das águas de abastecimento público um dos pilares básicos para a prevenção da cárie no Brasil. O Olhar Vital foi atrás da opinião de dois especialistas para saber: A fluoretação da água é confiável? Faz bem para a saúde? Por quê?

Miguel Lemos

Farmacologista e professor da Faculdade de Farmácia da UFRJ


“O Centro para Controle e Prevenção de Doenças, Divisão de Saúde Oral, em Atlanta, publicou recentemente um artigo favorável à presença e à segurança do flúor na água potável nos níveis recomendados para a prevenção da cárie. Os cientistas encontraram uma falta de evidências que mostram uma associação entre fluoretação da água e um impacto negativo sobre as pessoas, plantas ou animais.

O flúor é uma substância tóxica que pode causar distúrbios no sistema nervoso central como déficit de atenção, concentração e memória, mas somente quando encontrado em concentrações elevadas.

Porém a concentração de flúor nas águas da maioria dos estados brasileiros está em torno de 0,7 mg F/la, o que não representa risco para a saúde humana, segundo a literatura.

Sabemos que a fluoretação da água pode reduzir a incidência de cárie em até 60%, segundo estudos no Brasil. Por outro lado, trabalhos recentes demonstraram que, nos países onde a fluoretação foi abolida como Canadá, Alemanha, Cuba e Finlândia, o índice de aparecimento de cárie dental não sofreu nenhuma alteração.

A quantidade adequada de flúor em todas as fases da vida ajuda a prevenir e controlar a cárie, e, desta forma, melhorar a saúde bucal. Pesquisadores reconhecem que o mecanismo benéfico do flúor é principalmente tópico, o que você poderia obter ao escovar os dentes com cremes dentais que contém flúor. Assim, você não teria que engolir o flúor na água de beber para proteger os dentes. Já o flúor proveniente da água fluoretada seria absorvido e liberado lenta e gradualmente pela saliva, protegendo os dentes das cáries. Para aqueles que acreditam que os benefícios do flúor são apenas tópicos faz mais sentido levar o flúor ao dente na forma de creme dental.


O flúor não é um elemento essencial para a saúde humana, mas tem um papel preventivo indiscutível na prevenção e no aparecimento da cárie”.


Senda Charone

Especialista em Odontologia Social e Preventiva FO/UFRJ e mestre em Odontopediatria FO/UFRJ.

A Organização Mundial da Saúde reconhece e indica a fluoretação da água de abastecimento como medida de saúde pública. No Brasil, o Ministério da Saúde e as entidades representativas da área odontológica recomendam a fluoretação da água de abastecimento, seguindo as normas preconizadas pelo referido Ministério. O monitoramento é um recurso valioso e todos os aspectos positivos da fluoretação da água de abastecimento são dependentes da sua manutenção e estabilidade dos teores de flúor dentro dos níveis adequados.

A importância da manutenção de pequenas quantidades de flúor na cavidade bucal é essencial para o efetivo controle da cárie. Esse conceito da dinâmica de redução da cárie é baseado em pesquisas sobre o efeito do flúor durante a ocorrência da perda mineral nos dentes. Os níveis frequentes de flúor na boca reduzem a perda mineral dos dentes e, em consequência, a progressão da lesão de cárie.

De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, a fluoretação da água de abastecimento público é uma das dez mais importantes conquistas da saúde pública no século XX. Segundo o CDC, o controle da cárie por meio do uso da água fluoretada é de 40% a 70%, em crianças, dependendo do índice de prevalência de cárie, reduzindo entre 40% a 60% a perda de dentes em adultos. Portanto, o benefício da fluoretação da água é proporcionalmente maior nos segmentos da sociedade que não têm acesso a outras fontes de ingestão e, assim, mais necessitam dele.

O monitoramento constante dos equipamentos de fluoretação, bem como da manutenção da concentração de flúor dentro dos padrões recomendados é um problema constante nos sistemas de abastecimento em nosso país. A necessidade de desenvolver mecanismos de controle da fluoretação fez surgir o conceito do heterocontrole. ‘Heterocontrole é o princípio segundo o qual, se um bem ou serviço qualquer implica risco ou representa fator de proteção para a saúde pública, então, além do controle do produtor sobre o processo de produção, distribuição e consumo, deve haver controle por parte das instituições do Estado’.

A implantação de sistemas de vigilância baseados no heterocontrole pode contribuir efetivamente para melhorar a qualidade da fluoretação e, consequentemente, a redução da cárie na população. Temos como exemplo, estudos realizados no Brasil, na cidade de Bauru (SP), que demonstraram a importância de se avaliar a adequação e manutenção dos teores de flúor, através da implantação do heterocontrole da fluoretação da água de abastecimento público. No estado do Rio de Janeiro, está sendo realizado um estudo similar com a coleta da água de abastecimento público em 17 municípios para a avaliação da fluoretação da água de abastecimento. Esses resultados serão divulgados em breve.

Nesse contexto, o controle da fluoretação da água de abastecimento público tem papel de suma importância, no sentido de somar esforços para a melhora da condição de saúde bucal da população devido aos efeitos preventivos do flúor sobre o desenvolvimento da cárie. As ações de saúde pública, principalmente quando a água é empregada como veículo em função da sua abrangência coletiva, efetividade, custo e frequência de consumo, tornam-se essenciais para a população.”