• Edição 197
  • 12 de novembro de 2009

Microscópio

Grandes epidemias: o mal da humanidade

Cília Monteiro

Desde a Peste Negra, pandemia que varreu a Europa entre 1347 e 1351, algumas grandes epidemias marcaram a história da humanidade. Atualmente, temos o exemplo da Gripe A H1N1, que surgiu inesperadamente, atingindo propagação em escala global. “A sociedade vive em grande instabilidade. Não sabemos se um patógeno infeccioso tão letal quanto a Peste Negra, senão o mesmo agente, se elevará das entranhas da natureza”, relata Fernando Portela Câmara, professor e chefe do Setor de Epidemiologia de Doenças Infecciosas do Instituto de Microbiologia Professor Paulo de Góes (IMPPG) da UFRJ.

Segundo Fernando, a Peste Negra, ou Morte Negra, como ficou conhecida, foi de tremendo impacto para a sociedade: a mortalidade global teve índice de 50%, com regiões onde a taxa alcançou 70%. A pandemia trouxe consequências em setores como economia, meios de produção, política, religião e filosofia. “Esta foi a maior catástrofe da humanidade contemporânea e, na época, a população europeia crescera bastante. O norte sofria de fome crônica, devido à insuficiente produção agrícola e pastoral”, explica o professor.

No mesmo período, sobreveio uma mudança climática, prejudicando globalmente a produção agrária, motivo que fez com que a fome aumentasse ainda mais. “Essa conjunção, somada a guerras, deslocamentos de contingentes humanos, habitações precárias e superlotadas e grande miséria, debilitou a Europa. Isso contribuiu para que emergisse um dos mais temíveis agentes patogênicos de que temos notícia: o da Peste Negra, que, ao contrário do que é divulgado, não foi a Peste Bubônica, como muitos ainda pensam”, esclarece Câmara.

O problema na atualidade

“Vivemos uma época de megacidades e a maior parte se encontra em regiões em desenvolvimento. O crescimento urbano é desordenado e o saneamento precário para a maioria dos habitantes pobres. Populações de baixa renda tornam-se miseráveis dentro da globalização da economia. Contingentes humanos se deslocam a grandes distâncias e guerras étnicas e convencionais se ampliam, trazendo miséria. Florestas tropicais são invadidas e a exploração da terra se tornou predatória em muitas partes. Tudo isso gera instabilidade, que propicia a emergência e reemergência de patógenos com grande potencial epidêmico”, constata Fernando.

De acordo com ele, nos últimos 30 anos ocorreram a emergência da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), a reemergência da Dengue nas Américas e no Caribe e a expansão da Malária Falciparum. Além disso, aumentaram os casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), Influenza Aviária A H5N1 e da atual Influenza Suína A H1N1 pandêmica. “Isto sem falar da Varíola dos macacos em humanos, da ampliação da emergência dos vírus Ebola e Marburgm, e outros”, completa.

Para Fernando, desde o início do século XX, o caso mais marcante foi a pandemia de Influenza de 1918, que, segundo ele, ainda permanece um enigma. “Fato pouco divulgado foi que, concomitante a essa pandemia, a Rússia revolucionária, debilitada pela pobreza, fome e guerra, sofreu a maior epidemia de Tifo da história, morrendo três milhões de russos entre 1917 e 1925”, observa.

O professor acredita que todos esses eventos são prova da instabilidade da sociedade global atual e que não é possível fazer algo para manter a população prevenida de epidemias. “Não sabemos onde, como e que tipo de patógeno infeccioso irá emergir. Basta o exemplo da atual pandemia de Gripe A H1N1. Esperava-se que o tipo A H5N1 (aviário), muito mais letal, emergisse em algum lugar da Ásia. Mas fomos surpreendidos com a Gripe Suína A H1N1 no México e nos Estados Unidos. As pandemias são assim, não há como controlá-las. A teoria do caos nos ensinou que vivemos em um mundo regido pela imprevisibilidade”, aponta.

Perspectivas para o futuro

Para discutir o assunto e estimativas para o atual milênio, o Centro de Extensão em Microbiologia (CEM) do IMPPG promove, no dia 21 de novembro, o curso “A Peste Negra e as Grandes Epidemias da História: Perspectivas para o 3° Milênio”, coordenado por Fernando. “É um curso de oito horas, em que a Peste Negra será um modelo de pandemia de alta gravidade, que servirá para uma discussão mais ampla sobre a saúde pública no mundo atual”, indica Câmara. Na ocasião, a Gripe pandêmica será também objeto de estudo, em razão de sua atualidade.

O curso acontece das 9 às 18h, no próprio IMPPG, localizado no Centro de Ciências da Saúde, na avenida Carlos Chagas Filho, 373, Cidade Universitária. Interessados em participar devem entrar em contato com o CEM, através do telefone 2562-6736, ou enviar e-mail para ceem@micro.ufrj.br. Mais informações sobre o curso e assuntos relacionados podem ser obtidas no blog do professor Fernando Portela Câmara: popdinamica.blogspot.com.