• Edição 189
  • 17 de setembro de 2009

Argumento

Rede de pesquisas articula o país contra a tuberculose

Cília Monteiro


Com a missão de capacitar recursos humanos para controlar a tuberculose, foi criada em 2001 a Rede Brasileira de Pesquisas em Tuberculose (Rede-TB), que atua através da transdisciplinaridade e intersetorialidade. “Temos orgulho da Rede-TB ter nascido na UFRJ, a partir de dois seminários que promovemos, onde percebemos que não seria possível controlar a doença se não houvesse um consenso entre todas as áreas de conhecimento”, declara Afrânio Lineu Kritski, chefe do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina (FM) da UFRJ e vice-presidente da Rede-TB.

Segundo Afrânio, quando a Rede-TB foi planejada, vigorava a ideia de que pesquisas acerca da tuberculose eram desnecessárias, pois se tinham como suficientes os conhecimentos já adquiridos sobre a doença.

“Estávamos num momento em que o programa de tuberculose estava nas mãos do Ministério da Saúde e não havia participação da Academia, nem da sociedade civil. Não existia nenhuma organização não governamental (ONG) para dar suporte”, aponta. No entanto, era preciso controlar os índices da doença, aumentados na década de 1980, em que pessoas começaram a se contaminar pelo vírus HIV e ter sua imunidade prejudicada, favorecendo a ação do bacilo causador da tuberculose. Após uma reflexão sobre o histórico da doença, foi concebida a Rede-TB. “Tivemos sorte no início, pois foi aberto o edital dos Institutos de Milênio, grande financiador de redes de pesquisa. Nosso projeto esteve entre os 17 financiados dos 400 inscritos. Apenas três foram da área biomédica”, destaca Kritski. De acordo com ele, o financiamento é complicado, pois editais de pesquisa não contemplam redes.

Funcionamento

A Rede-TB conta com a participação de indivíduos das diferentes esferas de gestão na Saúde, Ciências Humanas, Engenharia, Educação e Pesquisa. E também inclui atores da sociedade civil: sociedades de classe médica ou não, ONGs ativistas ou assistencialistas, organismos de cooperação internacional, instituições religiosas e indústrias públicas ou privadas. Os projetos englobados pela rede de pesquisas ocorrem no Brasil inteiro, simultaneamente.

Existem diversas áreas de coordenação. Os responsáveis divulgam informações, relatórios e identificam novos pesquisadores. “A liderança é em função do momento e do tema em questão. A lógica de poder é parlamentarista e não presidencialista. É preciso utilizar o que foi feito de bom na gestão anterior e inovar, não jogar aquilo fora e depreciar, algo muito comum. Trabalhar em parceria dá mais trabalho, pois requer ouvir o outro. Mas, lá na frente, todo mundo sai ganhando. Somos fortes porque estamos juntos”, constata Afrânio.

Segundo o pesquisador, a rede segue princípios do Programa Acadêmico de Tuberculose da Faculdade de Medicina da UFRJ, atualmente coordenado por ele: é lançado um olhar multidisciplinar que inclui assistência, ensino e pesquisa. Kritski destacou que a UFRJ é uma das células importantes da Rede-TB. Através do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), por exemplo, acontecem novos testes para diagnósticos, além de avaliações de medicamentos e pesquisas clínicas.

Conquista

Em oito anos a rede de pesquisas já teve conquistas importantes: em 2003, colaborou para a viabilização das atividades iniciais do Fórum de ONG-Tuberculose do Rio de Janeiro. Esta foi uma primeira iniciativa de participação da sociedade civil nas ações de controle da doença no Brasil. Além disso, pesquisadores da Rede-TB participaram da criação da Parceria Brasileira contra Tuberculose, que hoje conta com 83 instituições.

Ainda houve envolvimento de integrantes da rede de pesquisas na elaboração dos objetivos do Projeto Nacional de Tuberculose para o projeto Fundo Global, iniciado em 2007, visando o fortalecimento das ações de controle da doença. No mesmo ano, pesquisadores da Rede TB foram convidados a integrar o Comitê Técnico Científico Assessor do Programa Nacional de Controle de Tuberculose do Ministério da Saúde. Kritski também destacou que membros da Rede TB são responsáveis por 60% da produção científica sobre tuberculose desde 2001.

A rede de pesquisas já interage com a Sociedade Latino-americana de Micobactéria e pretende estabelecer relação oficial com outros países da América Latina e da África. “Inclusive a Organização Mundial de Saúde (OMS) pretende utilizar a Rede-TB como exemplo para países do Hemisfério Sul”, ressalta Afrânio.

O professor considera a Rede-TB um movimento pró-ativo. “O profissional passa a perceber quão importante é produzir conhecimento. Procuramos mostrar que a Academia tem que ser utilizada como ferramenta para a sociedade como um todo. O mundo requer hoje abordagens inovadoras no ensino e a Rede-TB é praticamente o marco do que temos tentado fazer na UFRJ, seguindo essa margem”, conclui Afrânio Kritski.