• Edição 158
  • 15 de janeiro de 2008

Faces e Interfaces

Antioxidantes realmente agem contra o envelhecimento?

Cília Monteiro

Na incessante busca pelo rejuvenescimento, produtos e alimentos contendo substâncias antioxidantes se tornaram bastante populares. É aí que surgiu a polêmica: será que eles realmente são capazes de agir contra o processo natural e inevitável de envelhecimento pelo qual passamos? Um estudo realizado na Grã-Bretanha indicou que não existem indícios de que dietas e cosméticos com antioxidantes possam ser de fato eficazes. Para verificar a ação dessas substâncias, cientistas da University College London realizaram experimentos com vermes nematódeos. E concluíram: os tratados com antioxidantes não chegaram a viver mais que os outros.

Indústrias de cosméticos e suplementos alimentares alegam que os antioxidantes combatem os radicais livres, responsáveis pelo envelhecimento, de acordo com uma teoria de 1956. A Associação Dietética Britânica reconheceu a dificuldade de estudos anteriores em encontrar provas para sustentar a teoria. Já a Associação da Indústria de Cosméticos e Perfumaria britânica condenou o uso de nematódeos no estudo e disse que as empresas realizam pesquisas extensas para assegurar que os efeitos anunciados tenham fundamento. Para esclarecer sobre o assunto e falar sobre os alimentos com antioxidantes, o Olhar Vital convidou os especialistas:

Carlos Montes Paixão Júnior

Coordenador do Setor de Geriatria do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF)

Ninguém sabe ao certo sobre o envelhecimento. Há conjecturas que indicam que ele nunca foi uma preocupação da seleção natural, pois os animais tendem a morrer logo após a época reprodutiva. Apenas os seres humanos, como espécie, nos últimos 150 anos, é que passaram a envelhecer como grupo. Portanto, nossos problemas relacionados à saúde e envelhecimento são novos para a natureza. Sendo assim, os genes e programas que facilitam nossa reprodução na idade jovem não estão preparados para envelhecer. Desta forma, começam a falhar a partir da chamada meia idade, induzindo a doenças crônico-degenerativas. Também por isso, os genes que induzem o envelhecimento devem ser pouco numerosos e relativamente parecidos entre as espécies.

Então aparece a importância dos nematódeos como o Cenorhabiditis elegans. Já se descobriu, neste animal, um ou mais genes que, funcionando bem, garantem uma longevidade, chamados DAF231 e DAF2. Esses genes, em mamíferos, quando sofrem mutação e perdem sua função, induzem uma menor perda de energia e maior longevidade. Alguns outros descobertos, como o BCL2, promovem a produção de caspases (proteínas que protegem a célula de morte ou induzem a morte celular por apoptose, ou seja, por autodestruição), dependendo da substância. Também há uma proteção celular no final de cada cromossoma, uma cadeia de ácidos nucléicos repetidos sem função, chamada telômeros. Parece que, ao menos em seres humanos, seu tamanho é proporcional à proteção do DNA contra degeneração. A telomerase é a enzima que reconstitui o tamanho do telômero e, com o envelhecimento, ela tende a funcionar mal e, por isso, aumentar o risco de morte celular. Parece que o exercício físico aumenta a função da telomerase e, com isso, preserva a vida celular.

Como se pode deduzir, uma série de padrões pode induzir ou retardar o envelhecimento. Os antioxidantes possuem função pouco definida no organismo, mas, como promotores, ajudam enzimas como superóxido dismutase a restituir o número normal de elétrons nos átomos. Dessa forma, transformam substâncias tóxicas baseadas em radicais instáveis ou livres, em átomos estáveis, diminuindo as lesões celulares por eles causadas. O que ocorre é que a produção de radicais livres é benéfica para muitas de nossas funções. Os leucócitos ou glóbulos brancos macrófagos, por exemplo, utilizam estes produtos para destruir bactérias e outros seres invasores ao nosso organismo, como, por exemplo, células neoplásicas que estão escapando do controle do tecido. Por isso, esta questão de radicais livres é tão controversa.

Considero muito difícil acreditar que um cosmético, de efeito superficial, possa agir para (algo) além de apenas hidratar superficialmente a pele. Os alimentos, por outro lado, fornecem vitaminas e outros elementos que, em dose adequada, oferecem suporte para a função metabólica normal do organismo como um todo. Certamente, os alimentos adequados são ideais, independente dos efeitos que conheçamos. Para se ter uma idéia, uma dieta rica em frutas diminui riscos cardiovasculares e vários tipos de câncer. Vitaminas em comprimidos, nos estudos que tentaram utilizá-las, não demonstraram efeito algum neste sentido e, em alguns casos, aumentaram casos de doenças e morte.

A pesquisa com nematódeos é extremamente relevante. O C. elegans tem sido um instrumento essencial para se compreender o envelhecimento no ser humano. Isso contrapõe o porta-voz da indústria de cosméticos, que está tão somente defendendo os interesses corporativos, como tentaram os representantes da indústria do tabaco, face aos achados referentes aos riscos do fumo. O C. elegans é de fácil manipulação e tem vários genes muito parecidos com os nossos. Para se ter uma idéia, uma série de tratamentos para câncer foi pesquisada inicialmente nele.

A teoria de 1956 não tem bases sólidas, foi “inventada” por Linus Pauling, prêmio Nobel de Química Pura, mas que não tinha nenhuma noção de ciência biológica. Ele passou a fazer uso de megadoses de vitaminas, mas, por ironia, faleceu com câncer. Seus seguidores têm praticado o que se denomina medicina ortomolecular, condenada pelo Conselho Federal de Medicina exatamente por não oferecer bases científicas sólidas para sua prática.

Não há evidências de que o retardo de envelhecimento pelo uso de antioxidantes realmente ocorra. A melhor forma de se conseguir um equilíbrio saudável e consequentemente um envelhecimento mais lento é através de exercício físico regular desde a juventude, alimentação variada: pobre em gorduras, rica em frutas, legumes, peixes e óleo vegetal ou marinho. E ainda evitar excesso de álcool, tabagismo e exposição a substâncias nocivas.

Eliane Lopes Rosado

Professora do Instituto de Nutrição Josué de Castro (INJC)

O organismo normalmente está exposto ao estresse oxidativo e neste processo são geradas moléculas prejudiciais, chamadas radicais livres (átomos quimicamente ativos ou moléculas com um número ímpar de elétrons na órbita externa). Como apresentam um ou mais elétrons ímpares, eles são altamente instáveis e podem captar ou doar elétrons para outras moléculas do organismo. Os antioxidantes agem contra os danos oxidativos ocasionados pelos radicais livres. Podem ser considerados agentes "protetores" por se ligarem a esses radicais, impedindo que oxidem outras moléculas.

Alimentos de origem vegetal, como cereais integrais, legumes, verduras e frutas, contêm diferentes tipos de antioxidantes. Exemplos: a vitamina C presente nas frutas cítricas como laranja, limão, tangerina, acerola e em vegetais verdes. Também a vitamina A, nos vegetais amarelo-alaranjados, como cenoura e abóbora. Já a vitamina E é encontrada nos óleos vegetais.

Na forma de dieta é aconselhável consumir esses alimentos, visto que se ingere quantidade muito inferior ao máximo considerado tolerável. Vale ressaltar que as vitaminas A e E são lipossolúveis e podem se acumular no organismo caso ingeridas em quantidades acima das recomendações nutricionais. Se acontecer em longo prazo, pode acarretar efeitos negativos no organismo. Uma dieta variada e equilibrada terá a quantidade suficiente de antioxidantes.

Em relação ao envelhecimento, uma boa dieta oferece nutrientes em quantidade e qualidade necessárias para manter a nutrição adequada da pele. Muitas deficiências nutricionais, não somente de antioxidantes, poderiam prejudicar a saúde de forma geral. Não tenho dados para afirmar que retardariam o envelhecimento, mas a saúde da pele apresenta ligação direta com o consumo adequado de nutrientes, como proteínas, ferro e vitamina A, por exemplo.

Em minha opinião, um indivíduo que apresenta consumo regular de tais nutrientes teria vantagens, comparado àqueles que não o fazem. Principalmente quando comparamos a pessoas com alimentação rica em gorduras, industrializados, e pobre em vegetais, frutas e fibras. No entanto, existem outros fatores envolvidos no envelhecimento.

Os efeitos de uma dieta equilibrada seriam mais internos, quando falamos de radicais livres. No entanto, se um indivíduo adota um bom hábito alimentar, é possível observar a pele mais saudável em curto período de tempo. Isso ocorre devido à melhora do funcionamento intestinal, estado geral, disposição e coloração da pele, entre outros. Acredito que o envelhecimento tenha relação também com o estresse urbano, alimentação inadequada (de forma geral e não somente em antioxidantes), sol, aspectos genéticos, cor de pele, raça.

A melhor forma de se conseguir um organismo saudável e um envelhecimento mais lento seria através de uma alimentação equilibrada. Não é necessária uma dieta calculada, mas deve-se procurar ingerir alimentos mais naturais e variar a nutrição, incluindo cereais, leguminosas, vegetais (legumes, verduras e frutas), líquidos (mínimo de 2 litros por dia). Além disso, melhorar a qualidade da gordura ingerida, dando preferência a óleos vegetais. É aconselhável evitar frituras, alimentos prontos, enlatados e industrializados em geral. A alimentação também deve ser fracionada: deve-se evitar ingerir tudo no mesmo horário, dando preferência a menores quantidades, ingeridas em 5 a 6 vezes ao dia.

Recentemente fizemos um levantamento bibliográfico em relação ao uso de antioxidantes e doenças cardiovasculares. Observamos que os estudos ainda não são conclusivos quanto à suplementação. Pesquisas realizadas com suplementação contendo vitamina E, A e C não demonstraram influência marcante sobre a prevenção destas doenças. A American Heart Association (AHA) (em publicação de 1999) recomenda que o mais prudente para toda a população é o uso de dieta equilibrada, com destaque nos alimentos ricos em antioxidantes, como frutas, vegetais e cereais integrais, como forma de prevenir doenças cardiovasculares.