• Edição 158
  • 15 de janeiro de 2008

Ciência e Vida

Radiação UV e bisfenol A: danos ao ambiente e à vida


Cília Monteiro

Atualmente aparelhos de refrigeração e objetos de plástico são elementos de extrema utilidade para a sociedade. O que muitos não sabem é que esses utensílios liberam compostos químicos que acarretam problemas ambientais, para os ecossistemas, além de trazer conseqüências negativas à saúde humana. Tais efeitos foram estudados em crustáceos por Silvana Allodi, coordenadora do Programa de Biologia Celular e do Desenvolvimento, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB).

São poucos os cientistas especializados em crustáceos, cerca de 150 ao redor do mundo. Silvana começou suas pesquisas no início da década de 1990, interessada em aprofundar o conhecimento sobre invertebrados. Após publicar seu primeiro trabalho morfológico sobre o sistema visual dos crustáceos, passou a realizar uma pesquisa colaborativa com profissionais de outras universidades, adotando crustáceos de mangue como modelo. “O manguezal está sujeito a todas as radiações ambientais. Nádia Miguel, aluna de doutorado, desenvolveu sua tese verificando os efeitos da radiação ultravioleta no sistema visual desses animais”, indica. Depois de concluído este estudo, elas realizaram uma orientação de mestrado para observar as vias celulares envolvidas nos danos causados pela radiação.

Perigo dos compostos

Agora, Silvana orienta o estudo de efeitos dos raios ultravioleta no desenvolvimento total de camarões. “Submetemos fêmeas à radiação parecida com a que ocorre em Santa Catarina, onde há um pequeno buraco de ozônio. Observamos efeitos dramáticos nos ovos em desenvolvimento, como a alteração de sua morfologia”, relata a pesquisadora. De acordo com ela, são alteradas as estruturas que vão originar os órgãos dos sistemas dos adultos, além das células pigmentares dos olhos, que ficam maiores.

A camada de ozônio impede a passagem de radiações nocivas, como a ultravioleta B. Ar condicionado, geladeiras, compressores e aerossóis, são artefatos que emitem clorofluorcarbono, substância que sobe para a estratosfera e se combina com o ozônio, fazendo com que sua camada fique rarefeita. “Houve uma redução do buraco de ozônio a partir de 2005. Mas embora ele esteja menor em cima da Antártida, acabou se espalhando ao longo da parte sul do Hemisfério Sul. Agora já chega ao Brasil, mesmo que não tão rarefeito. É por isso que encontramos o efeito nos ovos dos crustáceos”, constata Allodi.

O bisfenol A é uma molécula usada na produção de plásticos poliestirenos. Chega aos crustáceos através do esgoto. Garrafas pet, copos descartáveis, mamadeiras de plástico, revestimentos internos de latas, tinta de extratos, tudo isso libera bisfenol. Com o aquecimento desses materiais, o processo ocorre mais facilmente. No organismo, o bisfenol A pode se conectar a receptores que deveriam ligar-se a hormônios chamados estrogênios. Quando isso ocorre, o bisfenol produz efeitos como os do estrogênio, só que está em quantidade muito maior. Isso pode acarretar resultados nocivos, como, por exemplo, o desenvolvimento de tumores que são responsivos ao estrogênio, quando estimulados pelo bisfenol.

Busca da solução

A professora apontou uma boa notícia na parte preliminar do estudo: possivelmente não há ingestão de quantidades drásticas de bisfenol A. “Esperamos que seja assim, mas ainda estamos nos experimentos iniciais. Fizemos uma avaliação mais morfológica, temos que começar outra mais molecular”, afirma Silvana.

— Vamos fazer experimentos para verificar se realmente, a partir das alterações em algumas espécies que estão no manguezal, pode haver impacto no ecossistema como um todo — relata Allodi. Ela ainda apontou a necessidade do estudo dos efeitos de um protetor: a melatonina. “Trata-se de um hormônio presente em todos nós, que aumenta quando a luz diminui. É uma das causas do sono”, explica. Existem trabalhos mostrando que a melatonina seria eficaz contra radicais livres gerados por agentes danificadores do meio-ambiente.

“Não queremos ver só estrago, mas também interferir positivamente”, expõe a professora. Silvana indicou como medidas inteligentes a volta à mamadeira de vidro, para que se reduza a ingestão de bisfenol A, além de uma melhor gestão do lixo. “É importantíssimo que todos estejam conscientes dos problemas do meio ambiente. É necessário que se dê educação nas escolas, nas mídias e através de campanhas”, conclui a pesquisadora.