• Edição 152
  • 13 de novembro de 2008

Saúde e Prevenção

Efeitos genotóxicos do chá branco

Sidney Coutinho

No ano 2737 a.C., o imperador chinês Shên Nung, pediu aos servos que lhe fervessem um pouco de água para beber enquanto descansava à sombra de uma árvore. De repente, uma folha se soltou e caiu dentro da taça. Sem reparar, o imperador bebeu a água fervida que deu origem ao chá. E assim reza a lenda da infusão das folhas da Camellia sinensis, originária da China e da Índia, e uma das mais disseminadas bebidas no mundo graças às suas propriedades. Mas a curiosidade dos cientistas também se volta sobre possíveis aspectos negativos da planta. No Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por exemplo, investigou-se a atividade genotóxica e mutagênica da espécie, ou seja, se a beberagem é capaz de provocar danos ou mutações aos gens.

Orientada pelo professor Álvaro Augusto da Costa Leitão, chefe do laboratório de radiobiologia molecular, Renata Demian Meinel, bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação Científica (PIBIC) pesquisou por quase um ano diferentes marcas de chá branco em busca de uma resposta para a indagação e concluiu que a beberagem é capaz de produzir lesões no DNA, pelo menos em bactérias. O chá branco é extraído dos brotos e flores da Camellia sinensis, sendo a colheita feita só uma vez ao ano. Ele possui grande quantidade de substâncias antioxidantes, alta concentração de polifenóis (antioxidantes), bioflavonóides (fortalece tecidos capilares e dá resistência contra infecções) e catequinas (responsáveis pela diminuição dos riscos de mau funcionamento celular).

De acordo com o professor Álvaro Leitão, ninguém está afirmando que o chá branco faz mal à saude. Apenas se descobriu que a bebida tem substâncias genotóxicas, que causam lesões ao DNA de bactérias, como se constatou em outros estudos feitos com o mate, o guaraná e outros tipos de chás. “Se isso vai causar lesões ao ser humano, não se sabe. Nesse caso específico, só testamos bactérias. Com chimarrão, por exemplo, nós fizemos algumas experiências com células humanas e constatamos que é possível sim provocar quebras na molécula de DNA. Se isto está ligado a maior quantidade de câncer de esôfago no sul do país não se sabe, é um outro estudo”, explica o professor, ressalvando, no entanto, que a pesquisa é o ponto de partida para diversas outras conclusões.

Para verificar os efeitos genotóxicos, usou-se um grupo de bactérias que depois da exposição ao chá liberaram bacteriófagos — um tipo de vírus que permanece inerte até que se detecte a iminente morte da bactéria. Ficou comprovado que a liberação dos vírus indicou as lesões no DNA, caracterizando a ação genotóxica. “Pegamos diversas qualidades de chá branco: em folha, solúvel ou em cápsulas. Só conseguimos detectar que ele faz lesões no DNA, mas não detectamos mutagênese”, afirmou Leitão, esclarecendo que as lesões genotóxicas em humanos são reparadas pelas células, enquanto a mutagênese pode dar origem ao câncer. “Claro que depois de uma série de mutações para se chegar ao câncer. Isso não ocorre de forma simples assim, de uma hora para outra. Além disso, o organismo tem defesas para isso. Tem de ser algo muito repetitivo”. Ainda raro e caro, o chá branco é menos processado que os chás verde e preto, pois é obtido da colheita de brotos que nem passaram pelo processo de fotossíntese.

De acordo com Álvaro Leitão, o estudo realizado é o primeiro passo antes de se aprofundar em novas pesquisas. “Quando você respira tem um monte de efeitos genotóxicos, mas está vivo, porque temos mecanismos para nos defender. A oxidação pela inspiração de oxigênio, por exemplo, causa efeito genotóxico. Assim, as pessoas podem continuar a beber chá branco sem se preocupar, pois não vai ter problema nenhum”, tranquiliza o professor.