• Edição 141
  • 28 de agosto de 2008

Por uma boa causa

A temida convulsão

Heryka Cilaberry

Para fechar a série Medicina infantil: quando levar ao pronto-socorro? iniciada há três edições e destinada à conscientização e orientação de famílias no tratamento e cuidado nos acidentes domésticos, o “Por uma boa causa” reservou para a última semana, esclarecimentos e conselhos que ajudam a lidar tranquilamente com uma das doenças que mais preocupa os pais: a convulsão.

O quadro é penoso para parentes e amigos que muitas vezes assistem impotentes às crises, tornando-as ainda mais assustadoras. Mas em geral, por mais que exista a participação e acompanhamento de pessoas próximas na doença, poucos sabem definir suas causas ou mesmo precisar todos os seus sintomas.

Assim, para desmistificar algumas das questões que marcam o obscurantismo que envolve as convulsões, o Olhar Vital contou com a participação de Lúcia Fontenelle, professora adjunta da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e neuropediatra do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), também da UFRJ.

Para a médica, as convulsões são decorrentes de uma descarga elétrica neuronal, resultado da disfunção de neurônios que passam a funcionar a um ritmo diferente dos outros. Disfunção que pode derivar de vários fatores, como explica Lúcia.

– Quando a criança é muito pequena, o cérebro é tão imaturo que não consegue se manifestar da mesma maneira que o cérebro da criança mais velha ou de um adulto. Há ainda tipos de crises convulsivas originadas em determinados locais do cérebro, fazendo com que a sintomatologia seja peculiar à região. Então, as manifestações vistas pelo observador, podem variar sob muitos aspectos, tendo características de acordo com essa descarga neuronal.

Algumas dessas manifestações abordadas pela neuropediatra são facilmente percebidas pelos pais como sintomas de uma crise convulsiva, porém há outras marcas comportamentais que não são detectadas com tanta destreza pelo leigo. “Apesar da manifestação convulsiva mais conhecida ser aquela em que o indivíduo bate os membros superiores e inferiores, há outros tipos de convulsão, em que o indivíduo urina, evacua ou perde a consciência (fenômeno principal). Há ainda manifestações em que a pessoa fica imóvel e outras, em que o indivíduo faz movimentos automáticos”, informa a neuropediatra.

 Um importante alerta aos pais é a atenção que se deve dar aos recém-nascidos para que se possam ser detectados sinais de convulsão com rapidez “a crise de recém-nascidos é difícil de ser reconhecida devido à sutileza dos sintomas, mas é preciso atenção se o bebê faz um movimento similar ao de pedalar ou de nadar”, acrescenta Lúcia.

Percebidos os sinais de convulsão, os pais costumam temer pelo pior e tomar medidas desesperadas, algumas vezes, inconseqüentes. Então um primeiro conselho é tentar manter a tranqüilidade. Pois de acordo com a professora, ainda que as crises tenham aparência feia, muitas são solucionadas de modo tranqüilo, cessando espontaneamente após alguns minutos. Em segundo lugar, não usar nenhum instrumento ou medida que costumam ser indicados para melhorar o quadro da criança.

– É comum que os pais peçam para que o indivíduo aspire algo, beba café. Ou mesmo o próprio responsável coloque a mão na boca da criança tentando segurar a língua. Atitudes famosas no histórico da crise convulsiva, conhecidas por causar a morte porque impedem o indivíduo de respirar. Isso não deve ser feito – alerta a médica.

Claro, finalmente, a melhor forma de tratar uma crise convulsiva, principalmente, quando é a primeira e a família ainda não está orientada, é procurar uma emergência.

– É dito que uma crise de até 20 minutos é passível de ceder espontaneamente, pois o cérebro possui mecanismos de defesa. De um modo geral, orientamos que em uma crise entre cinco e dez minutos, o responsável pelo paciente já se dirija ao hospital, porque não se pode saber se a convulsão terá apenas os cinco minutos, seis ou irá se prolongar para 20 ou 30 minutos, período chamado de estágio de mal convulsivo, uma crise tão prolongada que pode deixar seqüelas, pode lesar o cérebro – aconselha Lúcia.

Afinal, o que indica a apresentação de crises convulsivas?

Ela pode ser sintoma de uma doença no cérebro, por exemplo, um tumor; uma má formação, uma doença degenerativa, conforme explica Lúcia. “Pode ser também o que chamamos de idiopática, ou seja, aparentemente a criança não apresenta nenhum problema neurológico, ela brinca, corre, tem bons resultados na escola. De um modo geral, essa crise esconde alguma coisa desconhecida pela ciência, que provoca aquele determinado sintoma. Aparentemente, não há razão para aquela criança apresentar esse sintoma”, completa a professora.

A maior preocupação dos pais após a crise é a possibilidade de que restem seqüelas, que podem prejudicar para sempre o desenvolvimento de suas crianças. Mas quanto a esses problemas, os pais podem respirar um pouco mais aliviados. Segundo a médica, uma crise rápida, não costuma ter conseqüências graves à saúde.

– A criança pode apresentar apenas um pouco de sonolência, às vezes encontrando-se confusa ou vomitando, mas se recupera bem. As crises prolongadas de 20 a 30 minutos, quando não corrigidas de forma apropriada, podem deixar seqüelas de motricidade, seqüelas mentais. Ainda nesses casos, há crianças que se recuperam sem uma seqüela clara – garante Lúcia Fontenelli.