• Edição 125
  • 08 de maio de 2008

Argumento

Tabagismo tem influências genéticas e sociais

Tatiane Leal

O câncer de pulmão é o tipo de câncer que mais mata no mundo. Entre as causas, o tabagismo aparece disparado em primeiro lugar: é responsável por 90% das ocorrências desse tipo de câncer pelo mundo. As outras causas relacionam-se à poluição ambiental, radiação e exposição a substâncias químicas. Entretanto, estudos relacionando fatores genéticos à ocorrência do tumor no pulmão em fumantes vêm aparecendo na comunidade científica.

O pneumologista Alberto Araújo lembra que é certo que existem fatores genéticos, ambientais e sócio-comportamentais que interferem na dinâmica de causalidade do câncer de pulmão. O médico, que dirige o Núcleo de Estudos e Tratamento do Tabagismo (NETT) do Instituto de Doenças do Tórax (IDT), localizado no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) da UFRJ, acredita que a interferência da genética no aparecimento do câncer de pulmão ocorre na medida em que ela influencia que um paciente seja ou não dependente do cigarro, que é a causa principal do câncer de pulmão.

Alberto Araújo destaca que ter a necessidade de consumir uma maior quantidade de cigarros para satisfazer o vício tem ligações com a genética. “Existem fatores genéticos que levam a um metabolismo diferente da nicotina no fígado, o que explica porque alguns fumantes são compulsivos a ponto de fumarem a intervalos muito curtos. Eles têm uma característica genética de serem metabolizadores rápidos da nicotina”, explica o pneumologista.

O especialista também afirma, o genótipo mostra que os fumantes compulsivos também podem ter alterações nos mecanismos do sistema de recompensa cerebral. “Isso tudo faz de alguns fumantes presas mais rápidas e fáceis da dependência, a ponto de não suportarem acordar e ficar mais de cinco minutos sem fumar”, completa o pneumologista.

O vício também pode ser passado de pai para filho. “Atualmente, estudos na área de genética e tabaco, especialmente com gêmeos monozigóticos têm demonstrado um risco variável de 40 a 60 por cento dos filhos de fumantes se tornarem também dependentes da nicotina”, ressalta Alberto Araújo. O médico acredita que esses estudos na área de genética possibilitam uma integração com a farmacologia, que pode desenvolver o medicamento certo, na dose apropriada para cada tipo de dependente da nicotina, aumentando as chances da pessoa parar de fumar. A identificação das pessoas mais suscetíveis ao vício, como os filhos de fumantes, pode desencadear ações de prevenção.

- A primeira questão a se colocar é que o tabagismo é principal causa de morte evitável no mundo contemporâneo, sendo o responsável direto pela quase totalidade dos tipos de câncer de pulmão. A prevenção ao tabagismo e o tratamento de fumantes, por si só, já levariam a um grande impacto na queda do número de casos de câncer de pulmão -, afirma o diretor do NETT.

Alberto Araújo salienta que é preciso mudar os fatores ambientais e os valores culturais e sociais que fazem com que o indivíduo leve o cigarro à boca. “Não basta ter o componente genético da dependência. Para ela se exteriorizar é preciso haver uma conspiração de fatores sócio-ambientais presentes no ambiente do indivíduo. A aprendizagem social pela qual crianças e adolescentes passam, em casa com os pais fumantes e na escola ou na sociedade com os amigos fumantes, leva a um processo de experimentação, tolerância e finalmente em pouco tempo, à dependência propriamente dita”, reforça o pneumologista.

Essa aprendizagem social também passa pela mídia. Por muito tempo, vendeu-se uma imagem de glamour associada ao cigarro. “Muitos hábitos adquiridos podem ser fruto da exposição aos ditames da moda, do marketing e do mercado de consumo. A indústria de publicidade do tabaco explorou o glamour de Hollywood e os saudáveis ventos de mudança, seja nos papéis sociais das mulheres, seja nos movimentos por emancipação e liberdades dos anos 60. O cigarro por muito tempo foi associado de forma mentirosa ao sucesso, à juventude, aos resultados em esportes radicais e aos vencedores”, ressalta o médico. Hoje em dia, a propaganda de cigarros é proibida e tem se realizado um grande esforço para mudar essas concepções nas novas e antigas gerações.

Com todos esses fatores genéticos, sociais e ambientais favorecendo o tabagismo e, com ele, o desenvolvimento do câncer de pulmão, evitar o fumo continua sendo o melhor remédio para prevenir a doença. “Se todo fumante tivesse a idéia do que sofre uma pessoa com o câncer de pulmão pensaria muito antes de acender o próximo cigarro”, alerta o doutor Alberto Araújo, reforçando a importância da prevenção.