• Edição 122
  • 17 de abril de 2008

Saúde e Prevenção

Contra o bicho-de-pé: calçado

Marcello Henrique Corrêa

Tunga penetrans é o nome do pequenino invasor que pode causar aquela coceira incômoda. Trata-se de uma pulga – a menor de todas, de apenas 1 mm – que causa a tungíase, ou o popular bicho-de-pé, tema do Saúde e prevenção desta edição.  A doença é autolimitada (de cura espontânea) e, por isso, há casos, principalmente em áreas carentes ou rurais, em que os pacientes têm muitas infecções, simultaneamente.

Quem esclarece os detalhes da tungíase é Mônica Azulay, professora responsável pelo setor de Dermatologia Cosmética da UFRJ. “A contaminação acontece através da pulga, em locais arenosos, geralmente estábulos ou chiqueiros”, explica a professora. Segundo ela, o inseto pode contaminar tanto o porco quanto o ser humano e se comporta da mesma maneira.

Esse comportamento é justificado pela rotina de reprodução do animal, que precisa do sangue para continuar seu ciclo. “A pulga é hematófaga e precisa do sangue para poder ovular. Ela se liga ao porco ou ao ser humano e a partir disso ovula. Os ovos caem na terra e, em condições ideais, dão origem a novas pulgas”, esclarece. Apesar da existência do inseto estar ligada à presença de animais como porcos e vacas, não se sabe a razão da infecção.

De acordo com Azulay, apesar de ocorrer predominantemente em ambientes rurais, a infecção pode acontecer também no meio urbano, dependendo das condições do local. “A tungíase é uma doença de países tropicais. Onde há calor e umidade, a doença pode ocorrer”, afirma a professora.

Como o Brasil, assim como outros países de clima semelhante, apresenta temperaturas favoráveis durante o ano inteiro, a doença pode ocorrer sempre e não é uma “doença de verão”. “Há locais em que temperatura e umidade são ideais o ano todo, como o Rio de Janeiro, por exemplo”, comenta a professora.

Essa característica é comprovada por um estudo feito em conjunto por universidades do Ceará, Berlim e Townsville (Austrália) que revelou níveis endêmicos da doença em comunidades carentes de Fortaleza, próximas às dunas encontradas na cidade. Segundo a pesquisa, a situação é preocupante, agravada pelas condições de infra-estrutura: em 142 indivíduos foram encontradas 3.445 lesões, 17 por pessoa.

Os primeiros sinais

Segundo a professora, os sinais da infecção são muito característicos e é fácil perceber que há uma tungíase. De acordo com Mônica Azulay, as pápulas, bolinhas branco-amareladas, com um ponto enegrecido no centro, facilitam a identificação. “Normalmente as pápulas começam a aparecer ao redor das unhas dos pés e entre os espaços interdigitais (entre os dedos), causando coceira e, algumas vezes, um pouco de dor”, explica Azulay.

A possível dor é explicada pela distensão do abdome da fêmea, que é a causadora da doença. Segundo a dermatologista, o macho também se alimenta de sangue, mas sem causar dor, podendo se alimentar do sangue sem ser percebido.

Como a coceira é uma das conseqüências da infecção, o ato de coçar é muitas vezes inevitável. Entretanto, pode causar danos mais sérios ao paciente, segundo a médica. “O ato de coçar pode gerar uma infecção, até sendo uma porta de entrada para infecções secundárias, como abscesso, linfangite e tétano”, alertou a professora, ressaltando a importância da vacinação, principalmente contra o tétano.  

Diagnóstico e tratamento

Como os sinais são muito característicos, o diagnóstico se torna muito fácil, de acordo com Mônica Azulay. Com um relativo grau de conhecimento, o próprio paciente pode identificar o problema e procurar um dermatologista, segundo a professora.

Conforme explica a dermatologista, o tratamento, no caso de poucas lesões, consiste na retirada do invasor com auxílio de uma agulha devidamente esterilizada e limpa. “Há casos, no entanto, em que o número de lesões é muito grande e é inviável trabalhar o local. Nesses casos, é necessário partir para um tratamento oral”, descreve Mônica Azulay.

Mesmo que a pulga não seja retirada pelo tratamento com a agulha, a tendência é que de duas a três semanas o animal morra e a infecção seja curada, pois ela é autolimitada. “Contudo, não é o ideal. É melhor procurar logo o tratamento, inclusive para não ter as infecções secundárias”, aconselha a professora.

Prevenção

Para se prevenir da doença a receita é simples: usar calçados. Como a pulga normalmente infecta os pés, calçados são barreiras suficientes para impedir o problema. “Principalmente pessoas que trabalham com estábulos, por exemplo, precisam usar botas ou algo do tipo”, afirma a dermatologista. “O diagnóstico e o tratamento são simples e a prevenção é muito fácil: basta usar calçados”, finaliza Azulay.