• Edição 119
  • 27 de março de 2008

Notícias da Semana

Ginecologia inaugura Setor de Reprodução Humana

Marcello Henrique Corrêa

O Instituto de Ginecologia da UFRJ (IG) inaugurou, na última terça-feira, 25 de março, as instalações do Setor de Reprodução Humana. O evento reuniu professores da própria Universidade e de outras instituições. O encontro era mais do que uma inauguração. A proposta era homenagear a professora Clarice do Amaral Ferreira, pelos anos de dedicação à Ginecologia, especificamente à área de esterilidade (dificuldade em ter filhos). Não por acaso, o novo Setor recebe, a partir dessa data, o nome da professora – na placa, lê-se: Setor de Reprodução Humana Professora Clarice do Amaral Ferreira.

Um pouco de história

A solenidade ocorreu no anfiteatro do próprio Instituto. Logo após a execução do Hino Nacional, o professor Antônio Carneiro, diretor do IG, ficou encarregado de abordar um pouco da história da Ginecologia na UFRJ e no Brasil, lembrando que esses registros se confundem com a história da própria homenageada. "Eu, ao falar da história da Ginecologia, sei que estou cometendo um sério erro, pois estou aqui ao lado de uma pessoa que viveu grande parte dessa história", falou o diretor.

- Antes de 1935, pode-se dizer que a Ginecologia não existia no cenário interno. Foi só em 1936, quando o professor Arnaldo de Moraes assumiu a cadeira da Clínica Ginecológica da então Universidade do Brasil, hoje UFRJ, que se pode dizer que a Ginecologia começou de fato por aqui - expôs o médico. Antes dessa data, havia o ensino dessa especialidade, a cargo do professor Augusto Brandão, porém não era regular e era atrelado à Cirurgia Geral.

Após passar um período no Hospital Estácio de Sá, em 1942, Arnaldo de Moraes e seus assistentes se transferem para o Hospital Moncorvo Filho, onde o Instituto permanece até os dias atuais. Entretanto, a condição de Instituto de Ginecologia só se torna uma realidade até um Conselho Universitário de 1947. "Pelo voto unânime, decidiu-se que a Ginecologia, pelo seu prestígio, deveria ter seu próprio Instituto", ressaltou Carneiro.

Emocionado, o professor encerrou seu breve relato, lembrando de sua própria história. "Eu e a maioria dos presentes nos sentamos nas cadeiras desse anfiteatro, como alunos, nos formamos médicos com muita honra, nos tornamos professores e estamos aqui nessa Instituição até hoje", exaltou.

A mulher médica

- Falar da professora Clarice é falar de uma amiga. Tentarei falar aqui um pouco dos motivos que a fazem merecedora desta homenagem, para todo sempre, aqui na Reprodução Humana - assim começou a professora Maria do Carmo Borges, chefe do Setor de Reprodução Humana do IG. Segundo ela, no início da carreira de Clarice Ferreira, a medicina passava por mudanças e a mulher passava a ganhar espaço. "Quando a professora Clarice chegou aqui, aconteciam anos de mudança nos contextos da medicina. O médico, que era cirurgião, começava a se voltar para a mulher e para sua capacidade reprodutiva", explicou.

Apesar disso, a posição da mulher no exercício da Medicina ainda não tinha destaque. "Na verdade, esse início da Ginecologia convivia com o monopólio das parteiras. Essa atividade não era do saber médico, mas de responsabilidade das mulheres do povo", esclareceu, lembrando que a homenageada fez parte desse contexto, sempre à frente de seu tempo. "Nesse momento, a professora Clarice é a mulher médica, jovem, determinada, com muita força de vontade e que queria mais, queria o que ela podia alcançar. Tudo isso dentro do contexto da universidade – um ambiente nitidamente masculino", afirmou Maria do Carmo.

Essa força de vontade levou a professora à Argentina, para aprender mais. "Ela foi, depois que o professor convidou a todos os assistentes homens para ir e nenhum deles quis. Era uma bolsa para ir à Argentina e ficar no serviço de obstetrícia. Ela foi e ficou, morou no hospital por três meses, com as parteiras, porque não havia lugar reservado para a mulher médica, apenas para o homem médico", destacou Maria do Carmo.

O retorno dessa viagem coincide com o começo do ambulatório de esterilidade, iniciativa de Clarice Ferreira, fundamental para a criação do que hoje é o Setor de Reprodução Humana. "A gente tem uma trajetória, tudo isso porque alguém começou a andar, alguém mostrou o caminho e ensinou o que precisávamos fazer", concluiu Maria do Carmo.

Clarice do Amaral Ferreira, que a tudo assistia no anfiteatro, fez questão de agradecer à homenagem. "Só uma grande amizade poderia fazer com que buscassem o meu passado e fizessem dele alguma coisa de útil para as gerações futuras. Estou emocionada e posso sentir a dedicação de amigos que não me esqueceram", declarou.

Que há de novo?

Para o diretor Antônio Carneiro, as novas instalações do Setor serão fundamentais para o avanço da reprodução assistida no Instituto. "No momento, estamos tentando ir além. Para resolver a fertilidade do casal, precisamos de uma equipe multidisciplinar, que inclui psicólogo, assistente social, geneticista, enfermeiros, ginecologistas, entre outros. Vários fatores se complementam para fazer o diagnóstico. Às vezes o diagnóstico é simples e um tratamento medicamentoso resolve o problema. Às vezes é um pouquinho mais complicado e é preciso fazer uma cirurgia simples, Outras vezes, ainda, a situação é mais grave e é preciso fazer uma inseminação artificial", detalhou o professor.

Segundo o médico, as novas instalações possibilitarão, de imediato, a realização de inseminação artificial. Além disso, contribuirão para que, em breve, a fertilização in vitro possa acontecer, o que ainda não ocorre no Instituto. O professor destacou ainda que esse é um marco importante, pois nenhum serviço público do Rio de Janeiro oferece estes serviços com esta qualidade.