• Edição 098
  • 13 de setembro de 2007

Ciência e Vida

Álcool e direção: perigo iminente

Cinthia Pascueto - Agência UFRJ de Notícias - Praia Vermelha

Há 20 anos, José Mauro Brás de Lima, coordenador do Centro de Estudos de Prevenção e Reabilitação do Alcoolismo (Cepral – UFRJ), vem desenvolvendo pesquisas sobre os efeitos do álcool na saúde pública, com ênfase em seus desdobramentos no trânsito. Recentemente, o Cepral apresentou os resultados do estudo durante o 19º Congresso da Associação Brasileira de Estudos de Álcool e Drogas (Abead), que aconteceu de 5 a 8 de setembro no Hotel Glória, no Rio de Janeiro, e também durante a primeira Semana Mundial das Nações Unidas de segurança viária, ocorrido entre os dias 23 e 29 de abril, em Brasília.

Segundo o coordenador, um dos problemas mais sérios na saúde e segurança pública, do Brasil e do Mundo, é o abuso no consumo de bebidas alcoólicas aliado à direção. “Além dos problemas relativos ao trânsito, o álcool está relacionado a acidentes, a violência e a doenças”, expõe o especialista. Segundo estimativas sobre a ocupação de leitos nos hospitais, os relacionados ao consumo do álcool apresentam, “a terceira maior causa de morbimortalidade, representam a ocupação de cerca de 30% dos leitos em hospitais públicos, 60% nos hospitais psiquiátricos e 45% dos casos de emergência”, conta.

O médico destaca ainda os índices fornecidos pela OMS, de morte no trânsito: “O álcool é fator preponderante em 80% dos casos, morrem no mundo 1,2 milhões de pessoas em acidentes de trânsito. É fácil, portanto, reconhecer as implicações de uso e abuso de seu consumo”, revela. José Mauro conta também que a pesquisa utiliza dados fornecidos por testes de alcoolemia (nível de álcool por litro de sangue) realizados pelo Instituto Médico Legal em 94 vítimas de acidentes.

O teste detectou em 83 vítimas, 88,3% do total, a presença de álcool no sangue, dos quais, em 60,2% dos casos, tinham níveis de álcool superiores a 0,6 grama, o limite máximo tolerado. O especialista chama a atenção, porém, aos 38,3% de óbitos restantes, com nível de álcool no sangue abaixo deste limite, de índices entre 0,1 g/l a 0,59 g/l. “Esse número evidencia um aspecto importante do consumo de bebidas alcoólicas: dependendo da sensibilidade de cada pessoa e de co-fatores –  sonolência, fadiga, hipoglicemia, estresse e uso de medicamentos entre outros – a ingestão de álcool pode ser considerada uma efetiva condição de risco”, revela José Mauro, endossando a “urgente necessidade de ações e estratégias de políticas públicas, com o intuito de alterar essa triste realidade”.

Os projetos

Entre essas ações defendidas pelo coordenador estão a revisão do nível máximo de alcoolemia permitido; o controle de propagandas de bebidas alcoólicas e os avanços nesse sentido, surgidos com a Política Nacional sobre o Álcool, lançada em maio de 2007. Para a primeira proposta, José Mauro propõe a redução do nível de alcoolemia brasileiro, considerado alto. “Países da União Européia, como Suécia e França, já restringiram ou estão em campanha para reduzir de 0,5 grama para 0,2 grama o limite de álcool por litro de sangue do motorista. No Japão não há tolerância: o limite é 0,0”, exemplifica.

Quanto à propaganda de bebidas alcoólicas, o médico acredita na necessidade de um controle, principalmente para a cerveja: “Existe uma cultura de incentivo pesado ao consumo do álcool, em potencial ao da cerveja. É preciso então esclarecer à população, ao jovem em especial, que essa bebida não é fraca: três copos equivalem a uma taça de vinho ou uma dose de caipirinha, e atingem o limite de 0,6g/l de álcool no sangue, apesar de seus 5% de teor alcoólico”, enfatiza o pesquisador.

Além das indicações do especialista, há uma série de objetivos constituintes do plano da Política Nacional sobre o Álcool. Entre elas, consta a inspeção dos pontos de venda de bebidas em rodovias federais e estabelecimentos próximos a escolas, faculdades e a fiscalização de campanhas publicitárias direcionadas ao público jovem, estabelecendo regras para a propaganda – esta ação será elaborada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que já passou por consulta pública e será publicada em breve.

O jovem e a bebida

José Mauro ressalta ainda a importância de uma política no trânsito voltada para o jovem. “Dois terços das vítimas de acidentes são pessoas entre 18 e 29 anos. Comparando esta informação ao crescente consumo abusivo do álcool por essa faixa etária, entende-se porque a primeira causa de morte de jovens é de acidentes no trânsito”, compara. Segundo apuração feita em 2006 pelo Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas (Cebrid), encomendada pela Secretaria Nacional Antidrogas, o consumo de bebidas alcoólicas aumentou 30% entre jovens de 12 a 17 anos e 25% entre jovens de 18 a 24 anos, no período de cinco anos.

O especialista também alude à escolha do tema “Jovem: paz e amor no trânsito” pelo Conselho Nacional de Trânsito para a Semana de 2007, encontro que acontece entre os dias 18 e 25 de setembro. Segundo informações fornecidas no site do Departamento Nacional do Trânsito (Denatran). O evento visa debater a importância de medidas para prevenção de acidentes envolvendo os jovens, chamando sua atenção para as leis de trânsito e propondo uma discussão sobre toda a sociedade com o intuito de contribuir para um trânsito mais seguro.