• Edição 082
  • 24 de maio de 2007

Por uma boa causa

Doença de Creutzfeldt-Jacob: mais do que notificação, um alarme obrigatório

por Amanda Wanderley da Agência UFRJ de Notícias - Praia Vermelha

Creutzfeldt-Jacob. Poucas pessoas já ouviram essa palavra, mas todas deveriam aprender sobre a doença que leva esse nome e que por preocupar tanto as autoridades mundiais de saúde, é de notificação compulsória. Qualquer suspeita de paciente infectado deve ser comunicada à vigilância sanitária, porque, além de atacar o sistema nervoso central e ser fatal, em seis meses a um ano, a doença de Creutzfeldt-Jacob (DCJ) é transmissível e pode surgir por mutação.

Segundo o Ministério da Saúde, a DCJ possui uma incidência aproximada de um caso para um milhão de pessoas e é atribuída a uma partícula proteinácea infecciosa denominada príon. A doutora Ana Lúcia Rosso, neurologista e chefe do setor de Desordens do Movimento do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ, explica que a príon se deposita no cérebro e transforma algumas proteínas das células cerebrais, matando essas células. Com isso, o tecido cerebral é comprometido, dando início ao quadro clínico da doença que começa com uma demência muito forte, agitação, distúrbios de comportamento e de sono e abalos involuntários do corpo, sem a perda da consciência. “Esses fatores formam o diagnóstico da DCJ, complementado pelo eletro encefalograma, exame que mostra características especificas dessa doença”, completa Ana Lúcia.

A neurologista enumerou as formas conhecidas de infecção, “essa proteína passa de pessoa para pessoa através de manipulação inadequada de sangue e secreções, como urina, lágrima, saliva, de indivíduos infectados”. A médica explicou que, ao contrário dos vírus, a proteína de Creutzfeldt-Jacob tem tempo de vida duradouro fora do organismo e que qualquer material contaminado deve ser esterilizado a temperaturas altíssimas ou descartado seguindo procedimentos adequados para evitar a contaminação de pessoas que mexem em lixo. “Quem cuida de pacientes com a DCJ deve tomar cuidado, pois, por serem demenciados, usam fraldas e, portanto, a manipulação deve ser feita com luvas duplas”, alerta Ana Rosso que ainda destaca que cirurgiões, principalmente os neurocirurgiões, são mais suscetíveis à contaminação, devido ao contato com instrumentos intracerebrais.

Mistérios de Creutzfeldt-Jacob

Outra maneira de infecção é a mutação. O gene, uma proteína normal no organismo humano, pode se transformar e se manifestar como a proteína de Creutzfeldt-Jacob. “Essa possibilidade é um mistério que os pesquisadores tentam desvendar, ninguém sabe o que ativa a mutação”, revela a especialista. Segundo ela, os estudos realizados procuram descobrir por que e como uma proteína infecta, de onde ela vem, porque muta e qual a cascata de eventos que ela desencadeia para que os médicos tentem impedir a progressão.

Creutzfeldt-Jacob e a doença da vaca louca

Há um paralelo entre a DCJ e a doença da vaca louca. De acordo com o Ministério da Saúde, em 1996, o governo inglês declarou a possível existência de conexão entre a Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB) - conhecida como doença da vaca louca - e o desenvolvimento de uma nova forma da DCJ, que foi denominada de variante da DCJ (vDCJ).

Segundo Ana Rosso, a vaca louca é atribuída a uma proteína infectante da cabra e surgiu porque o gado se alimentava de cabra. Essa proteína se adaptou à vaca, a mesma doença que ela causa à cabra, causa ao bovino. “Acontece que casos da DCJ já existiam no humano antes do surgimento da doença da vaca louca, mas ninguém sabe se o homem pegou a proteína da cabra, assim como a vaca o fez. O que é sabido é que na espécie humana a contaminação se deu a partir de uma tribo de canibais que se alimentava de indivíduos da mesma espécie já contaminados” comentou a médica.

A doença de Creutzfeldt-Jacob no homem surgiu antes da vaca louca. Na Inglaterra e na França, criadores de gado começaram a alimentar o rebanho com cérebro e ossos de cabra que estavam infectados, contaminado-o, o que gerou a doença da vaca louca. “Como ingerimos peças do boi (miolo, intestino) a doença, que era originalmente da vaca, passou para os humanos, desenvolvendo a vDCJ, variante da doença de Creutzfeldt-Jacob.