Quando pensamos em metais, a primeira imagem que costuma vir à mente são as de objetos rígidos e inorgânicos, como por exemplo o alumínio da janela, o ouro das jóias ou o ferro que ajuda a construir pontes, automóveis e se encontra com freqüência em componentes de alta tecnologia. Sem os metais, no entanto, a vida humana simplesmente não existiria. Cálcio, potássio, sódio, zinco, ferro, cobre, cobalto, manganês e crômio são substâncias metálicas indispensáveis ao desenvolvimento do homem.
Alguns metais e semimetais, ao contrário, podem causar graves danos quando absorvidos em excesso. Nesse grupo etsão incluídos o mercúrio, o arsênio, o cádmio e o chumbo. Este último é encontrado em materiais largamente comercializados, como massa de vidraceiro – substância utilizada para fixar o vidro numa moldura —, soldas e fusíveis. O mercúrio é facilmente absorvido através da respiração, e também pela ingestão de peixes de água doce. As duas substâncias são bio-acumulativas: uma vez que se instalam no organismo, dificilmente sairão. A contaminação acontece de maneira imperceptível e, quando em níveis pequenos, é assintomática. Os sintomas começam a aparecer apenas no momento em que a taxa destas substâncias ultrapassa os limites do aceitável.
Contaminação e riscos do chumbo e mercúrio
Os peixes de água doce como atum, piranha e peixe-espada,
e também mamíferos marinhos, possuem uma
concentração elevada de mercúrio no
organismo. O professor Jean Remy Davee Guimarães,
do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho (IBCCF),
explica que os garimpos, bastante freqüentes na região
amazônica, fazem uso do mercúrio para purificar
o ouro, num processo conhecido como “amalgamação”.
Como essa substância é bastante volátil,
pode ser levada pelo ar para regiões a centenas
de quilômetros de distância, contaminando pessoas
que sequer desconfiam do risco.
O professor esclarece que em todas as pessoas há alguma concentração de mercúrio no organismo, algo que normalmente varia em torno de 2 ou 3 ppm (partes por milhão), medidas através do fio de cabelo. “Populações ribeirinhas, que consomem peixe diariamente, chegam a ter concentrações de 10 a 12 ppm”, afirma ele. A taxa de ingestão de peixe por estas populações supera o limite de segurança indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O excesso de mercúrio no organismo, a longo prazo, traz conseqüências importantes, como falha na coordenação motora, tremores, ansiedade e depressão.
Quando se fala em chumbo, os riscos são também graves. O professor Jean explica que “esta substância é confundida com o cálcio pelo organismo, e acaba entrando na composição de ossos e dentes. Uma pessoa de 70 anos tem 100 vezes mais chumbo nos ossos do que um recém-nascido”. Os problemas da alta concentração de desse componente no organismo incluem mudanças na coloração da gengiva e da pele, que adquire tom acinzentado, convulsões, delírio, tremores musculares, vômitos e náuseas.
Até os anos 1970, todas as tintas de parede continham muito chumbo, cádmio e outras substâncias tóxicas. Em reformas de habitações antigas, a raspagem da tinta velha produz um pó bastante prejudicial à saúde. As tintas fabricadas hoje não contêm essas substâncias nocivas, mas, mesmo assim, deve-se tomar cuidado.
Casas antigas também podem ter encanamentos de chumbo. Em cidades antigas de Paris, por exemplo, alguns prédios que, por razões sócio-econômicas, não foram reformados, ainda possuem canos feitos desse material. “O rendimento escolar das crianças que entram em contato com o chumbo diariamente é menor, se comparado àquelas que vivem em lugares onde o encanamento é feito de material não-tóxico”, atesta o professor.
Mães e filhos
Todas estas substâncias passam do corpo da grávida
para o feto. Ainda que, na mãe, o mercúrio
e o chumbo não provoquem alterações
significativas na estrutura corporal e capacidade motora,
podem afetar de maneira bastante profunda o desenvolvimento
do bebê. O professor alerta que “o excesso
de mercúrio passado da mãe para o bebê pode
acarretar menor peso ao nascer, atrasos no desenvolvimento
mental e no crescimento”.
Se a mãe descobrir que possui uma concentração alta de mercúrio no leite, vale a pena interromper a amamentação? De acordo com o professor Jean, isto apenas deve acontecer se a concentração da substância for extremamente elevada: “se a mãe quiser parar de amamentar o filho por descobrir que possui mercúrio no leite, irá privá-lo de uma série de nutrientes essenciais ao crescimento e ao fortalecimento do sistema imunológico da criança. Existe a vantagem de diminuir o contato dele com o mercúrio, mas a concentração da substância no leite precisa ser bastante elevada para que tal privação compense”, recomenda o professor.
Transdisciplinaridade no tratamento
Quando alguém está contaminado por mercúrio
ou chumbo e sofre com os sintomas citados acima, dificilmente
haverá uma orientação médica
correta, de acordo com Jean. Segundo ele, “o diagnóstico
não é feito de forma rápida, pois
falta transdiciplinaridade na área de saúde
ambiental”. A integração entre diferentes
interfaces do saber é, portanto, uma maneira fundamental
de alcançar a eficácia na prevenção
e tratamento deste problema.