• Edição 058
  • 19 de outubro de 2006

Microscópio

Poliomielite pode deixar vestígios 50 anos depois

Isabella Bonisolo

A Síndrome Pós-poliomielite acomete cerca de 70% das pessoas que contraíram o vírus da poliomielite. No entanto, há controvérsias se realmente ela exista como doença relacionada à paralisia infantil. Para discutir esse problema pouco conhecido e de difícil diagnóstico, a Associação Brasileira de Síndrome Pós-Poliomielite (ABASPP) promove o III Simpósio Brasileiro de Síndrome Pós-Poliomielite (SPP), em São Paulo, nos dias 20 e 21 de outubro.

Não existe um consenso que afirme a SPP como uma doença relacionada diretamente à poliomielite. Sabe-se que ela é uma série de sintomas que podem ou não surgir nos portadores do vírus da pólio. O curioso é que os problemas que se apresentam tardiamente não guardam relação com a deficiência anterior, adquirida na infância.

O paciente com essa síndrome de degeneração neuromuscular geralmente sofre com a intolerância ao frio, depressão, desvio de coluna, fraqueza muscular global, cansaço e insuficiência respiratória, o que leva a diminuição da expectativa de vida. Pesquisas ainda revelam que 72% dos portadores da SPP apresentam distúrbios do sono e 80% dor nas articulações.

O fato de não haver conhecimentos consistentes na área trás dificuldades para o indivíduo com SPP. “Como há pouca informação, às vezes o doente vai para o hospital e a síndrome não é reconhecida. Isso evolui mal, diferentemente do paciente que descobre o seu problema logo no início. A pessoa tem que estar atenta que ela é portadora de SPP, pois se começar a fazer insuficiência ventilatória, ele terá que ir direto para o CTI”, alerta doutora Denise Xerez, chefe do Serviço de Medicina Física e Reabilitação (SMFR) do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF).

Entre as várias correntes que discutem o assunto, há pesquisadores que consideram a SPP uma reativação do próprio enterovírus da pólio. Por outro lado, há aqueles que acreditam que os sintomas ditos da síndrome sejam apenas uma fadiga crônica, conseqüência do esforço abusivo das juntas ao longo da vida, mas que pode ser encontradas em outras doenças. “O que nós observamos é que todos que envelhecem com uma deficiência, envelhecem diferente das outras pessoas. Geralmente forçaram mais as suas articulações e estruturas, o que valida o argumento dos sintomas da SPP não serem exclusivos da pólio. Acredito que a síndrome seja pelo uso excessivo e não algo ligado exclusivamente à doença poliomielite”, argumenta a médica.

— Antigamente, principalmente a Escola Americana, forçava as pessoas a andarem mesmo que elas não tivessem condições mecânicas para isso. Fazia-se muito exercício, usava-se o tutor (aparelho que dá sustentação vertical aos membros inferiores), enfim, forçava-se muito a musculatura. As pesquisas mostram que quem se submeteu à essas condições e protelou o uso da cadeira de rodas, tem uma incidência maior de SPP — explica a especialista.

O lema americano que pregava “No pain, no gain” (Se não doer, não há ganho) deixou seqüelas para muitos portadores de poliomielite que, quando jovens, foram forçados a ir além de seus limites. Cerca de quarenta anos depois, esses que foram considerados bem sucedidos por um tempo, são os que apresentam os piores quadros de SPP. Para doutora Denise, é necessário respeitar os limites do paciente, já que a tendência é a musculatura falir antes da hora.

A reabilitação da Síndrome Pós-poliomielite não envolve exercícios de fortalecimento, já que a massa muscular não responde. O trabalho com o paciente consiste em alongamentos e no ensino de como ele pode economizar energia no seu dia a dia.