• Edição 048
  • 10 de agosto de 2006

Por uma boa causa

Doença resiste aos tempos bíblicos

Mariana Elia

Vênus, a deusa do amor. Essa é a origem para o termo doença venérea, que hoje em dia tanto nos assusta. Tão antigos, ou até mais remotos, são os registros sobre a gonorréia, doença sexualmente transmissível sobre a qual se têm informações desde os tempos bíblicos e que assim foi denominada, no século II d.C., por Galeno (gonos = espermatozóide + rhoia = corrimento).

A gonorréia é uma infecção causada pela bactéria Neisseria gonorrhoeae, ou simplesmente gonococo, que se caracteriza por ser bastante sintomática nos homens e de difícil percepção nas mulheres. Segundo o professor Gutemberg Leão de Almeida Filho, do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFRJ e coordenador do programa de pós-graduação da FM, o corrimento purulento uretral, a ardência e a dificuldade de micção são os principais sintomas masculinos, enquanto que as mulheres apresentam-se muitas vezes assintomáticas.

Essa característica dos casos femininos não as liberta da infecção, o que pode trazer complicações, além de serem transmissoras da doença. “A gonorréia desenvolve uma infecção do trato genital baixo, como a uretrite e a vaginite, mas ela pode subir para o trato genital superior (pélvico). Isso acarreta infecção no útero e inflamação das trompas de Falópio”, explica o professor Gutemberg, que acrescenta ainda a possibilidade de inflamação da cavidade pélvica e abdominal. As conseqüências nos homens são mais brandas e menos freqüentes, sendo a prostatite aguda e a epidimitite (região dos testículos) as mais comuns.

As mulheres que contraem a doença no período de gravidez podem transmiti-la ao feto no momento do parto, quando o bebê passa pelo canal vaginal, ocasionando oftalmia gonocócica. E é preciso ficar realmente atenta, pois a gonorréia pode desencadear a ruptura prematura das membranas e, por conseqüência o parto prematuro, o nascimento de bebê muito pequeno, a septicemia neonatal e inclusive a morte fetal.

Para eles, a sintomatologia é normalmente suficiente para dar início ao tratamento, baseado em antibióticos simples. A bacterioscopia é utilizada para confirmação de cura, mas é fundamental para indicar a infecção nas mulheres. É preciso também um exame de cultura em meio thayer-martin para confirmar a presença da bactéria. “A Neisseria gonorrhoeae é frágil, no entanto, é freqüente a co-infecção, principalmente com a clamídia. Deve-se levar em consideração de que vivemos em tempos do HIV, que baixa a imunidade e facilita a transmissão e a aquisição das DST´s”, diz o professor.

O professor Gutemberg de Almeida indica dois problemas que dificultam um conhecimento epidemiológico da gonorréia no Brasil. “De uma forma geral, existem dados, mas não são tão fidedignos quanto em outros países. Primeiro porque a automedicação, principalmente por homens, impede uma relação honesta dos casos. E, ainda por cima, não se tem uma rigidez no controle de registros, pois poucos centros interessam-se pelo assunto”. Segundo o professor, o ideal seria haver uma assistência de saúde estruturada e especializada, com centros de DST e criação de laboratórios centrais, o que auxiliaria o registro em escala nacional.