Agência de Notícias da UFRJ www.olharvital.ufrj.br
Edição 177
25 de junho de 2009

Faces e Interfaces

Falta de recursos no combate à febre amarela

Beatriz da Cruz e Cília Monteiro

A febre amarela é transmitida pelo Aedes aegypt, o mesmo mosquito vetor da dengue. Segundo noticiaram alguns veículos de informação, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que o programa internacional contra a doença pode simplesmente acabar em 2010 diante da falta de recursos. Isso deixaria milhões de pessoas desprotegidas, principalmente na África.

O estoque emergencial de vacinas deve terminar no ano que vem e, por enquanto, a OMS não tem dinheiro para comprar mais, nem para saldar uma dívida milionária. “No entanto, o Ministério da Saúde brasileiro compra estoques da vacina e não há risco de falta no país”, destaca o O Estado de São Paulo. Para falar um pouco sobre a doença e o papel da OMS nessa questão, o Olhar Vital convidou os especialistas:

Maulori Curié Cabral

Professor do Instituto de Microbiologia Professor Paulo de Góes

“A febre amarela é uma virose transmitida por mosquitos que teve grande repercussão na saúde pública do continente americano no passado. Principalmente nas cidades litorâneas onde aportavam navios que faziam o tráfego de escravos oriundos da África. De carona nesses navios vinham os mosquitos da espécie Aedes aegypti. Esses mosquitos são altamente adaptados ao ambiente urbano, pois as fêmeas, quando precisam se alimentar de sangue, procuram os seres humanos como doadores.

A OMS, como agremiação que congrega as atividades dos Ministérios da Saúde dos vários países-membros, tem a responsabilidade de zelar para que a conduta adotada pelos países possa garantir o efetivo controle da febre nas áreas urbanas. A ressalva às áreas urbanas é porque existe febre amarela nas regiões silvestres dos continentes africano e sul-americano. Essa forma silvestre da virose é mantida na natureza por meio de uma cadeia infecciosa envolvendo mosquitos e macacos no ambiente das florestas. Por isso existe o risco de pessoas que adentram nas matas serem picadas por mosquitos silvestres contaminados. É essa situação que tem sido motivo de preocupação por parte dos vários países onde a febre amarela é enzoótica (exclusiva de animais).

Os governos nacionais exercem vários papéis no controle dessa virose. Um deles é fazer esclarecimentos à população sobre a doença. Outro é adotar medidas que minimizem as possibilidades de pessoas contaminadas com a doença no ambiente silvestre virem para as áreas urbanas onde existe Aedes aegypti. Neste caso, a recomendação é fazer uso da vacina nas pessoas que adentram nas florestas.

A vacina contra febre amarela é considerada uma das vacinas para uso humano de maior eficácia. Seu custo é tão baixo que as empresas especializadas em produção de vacinas não mostram interesse em fabricar, pois não geraria lucro.

As medidas preventivas a serem tomadas para evitar a doença são as mesmas que hoje conhecemos para controlar os casos de dengue nas áreas urbanas, pois os mosquitos transmissores de ambas as viroses são da mesma espécie. No Brasil as regiões Norte e Centro-Oeste são as mais afetadas pela febre amarela silvestre.

O desempenho do sistema de saúde pública brasileiro na prevenção da doença é muito bom graças a sua eficiência. No país o problema da febre amarela atualmente encontra-se sob controle, situação esta reconhecida e elogiada no mundo inteiro. Essa eficiência no controle da doença é decorrente das campanhas iniciadas por Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, durante o período de governo de Rodrigues Alves.”

Edimilson Migowski de Carvalho

Professor de Infectologia Pediátrica da UFRJ e Pediatra do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG)

“A febre amarela, do ponto de vista clínico, se parece com a dengue. Só que é uma forma bem grave, com fenômenos hemorrágicos frequentes. A transmissão é por picada de inseto de mosquitos contaminados, igual ao observado com a dengue. O problema da febre amarela no Brasil ainda é grande e vem afetando a cada ano um espaço mais extenso.

Nosso país é quase todo área de risco. A febre amarela afeta todo o território brasileiro, com exceção das regiões mais litorâneas do sul, sudeste e nordeste. O Espírito Santo, embora seja um estado do litoral, também é considerado um local de risco. Em comparação com outros países, estamos piores do que vários da América Latina, porém, em melhor situação do que os do continente africano.

Mais uma vez nos deparamos com a falta de responsabilidade e de visão na promoção de saúde. Se gasta muito com o tratamento de doenças e se investe pouco na promoção de saúde e prevenção. Não considero bom o desempenho do sistema público, está muito aquém do desejável. Investe-se pouco em medidas preventivas contra as doenças e as consequências são os gastos exorbitantes com o tratamento. Os resultados sempre são piores.

No entanto, no Brasil existem áreas com excelentes coberturas vacinais contra a febre amarela e o estoque que me foi informado, de 28,5 milhões de doses para 2009, me parece ser satisfatório. Mas a educação permanente é fundamental, tanto para os profissionais de saúde quanto para a população em geral. É um meio de melhorar o país em relação a essa doença. Sem educação temos muito mais dor, sofrimento e mortes.

Acredito que vacina é um investimento que, de maneira alguma, pode ser considerado como despesa. A OMS precisaria investir de forma mais pesada, consistente e frequente em promoção de saúde e prevenção de doenças. Não se admite a falta de vacinas. É válido destacar que, no mundo, apenas 1,7% dos gastos com medicamentos é destinado a vacinas. Trata-se de um dado assustador.”

Anteriores