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Edição 154
27 de novembro de 2008

Ciência e Vida

Influência do óleo de peixe sobre o metabolismo lipídico

 

Cília Monteiro

Fatores dietéticos têm demonstrado forte influência sobre a função tireoideana. Um bom exemplo é o óleo de peixe, que comprovadamente diminui as taxas de colesterol e triglicerídeos do organismo. “Populações que o consomem, mesmo que em cápsulas, apresentam uma menor incidência de doenças cardiovasculares e aterosclerose”, informa Carmen Cabanelas Pazos de Moura, professora do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho. “Trabalho há muitos anos em laboratório com a ação do hormônio tireoideano e a regulação de sua produção”, relata a professora. De acordo com ela, trata-se de um hormônio com importante papel na regulação do metabolismo lipídico.

Segundo Carmen, os componentes do óleo de peixe responsáveis por seus efeitos positivos são os ácidos graxos poliinsaturados do tipo n-3, chamados ômega três. “Seu mecanismo de ação não é muito conhecido, sabe-se que regulam o metabolismo hepático de lipídios, diminuindo a síntese de colesterol e glicerídeos e aumentando a oxidação de ácidos graxos”, explica a pesquisadora.

– Começamos a nos perguntar se o óleo de peixe não estaria de alguma maneira interferindo também na ação do hormônio tireoideano, visto que parte de seu efeito poderia ser proveniente de uma melhora na produção ou ação deste hormônio – indica Carmen.  Para que a questão fosse investigada, iniciou-se uma pesquisa em parceria com o Instituto de Nutrição Josué de Castro (INJC).

Conforme relatou Carmen, os objetivos do estudo estão relacionados a aspectos nutricionais. A pesquisa corresponde a uma tentativa de comprovar que é necessário modificar o padrão lipídico das dietas para se obter efeitos positivos à saúde. “Efetivamente não restam dúvidas de que uma dieta rica em peixe, ômega três, é muito mais saudável e traz benefícios bastante demonstrados na literatura”, expõe a professora.

Experimentos

Os experimentos consistiam em oferecer a um grupo de modelos animais, desde seu período neonatal, uma dieta rica em óleo de peixe, enquanto outro grupo seria alimentado através de uma dieta padrão, equilibrada, porém sem abundância em ômega três. “Os ratos de laboratório foram tratados até a vida adulta e tiveram peso e ingestão alimentar avaliados. Depois de sacrificadas, pudemos avaliar o colesterol, triglicerídeos, HDL, secreção do hormônio tireoideano e verificar se havia alguma alteração na função da tireóide”, aponta Carmen.

Não foram encontradas alterações na produção do hormônio e os parâmetros de secreção da tireóide estavam normais. Após esta etapa, foi avaliada a expressão do receptor de hormônio tireoideano no tecido hepático. Observou-se que estava aumentada. “Receptor é a molécula através da qual o hormônio tireoideano exerce seus efeitos. Seu aumento sugeriu que talvez os efeitos deste hormônio no tecido hepático estivessem também mais elevados”, indica a pesquisadora. 

Para testar a hipótese, foi avaliada a atividade de uma enzima considerada marcadora de ação de hormônio da tireóide no fígado. “Verificamos que houve um aumento importante desta enzima, e imaginamos que o tratamento crônico dos animais com dieta em óleo de peixe esteja melhorando a ação hepática do hormônio tireoideano”, constata Carmen. De acordo com ela, os animais tratados com esta dieta ganharam menos peso e apresentaram diminuição de gordura visceral.

– Importante ressaltar que esta não é uma dieta hiperlipídica, portanto fornecemos os lipídios em quantidades normais, de acordo com o necessário para que o animal mantenha seu peso ideal, dentro de uma dieta normolipídica – observa a professora. O que ocorre é uma substituição de lipídios para que a fonte lipídica da dieta seja enriquecida em ômega três.

Importância e alternativas

Carmen acredita que o mais interessante na pesquisa é demonstrar que se o indivíduo tiver uma dieta rica em ômega três, pode se precaver de danos à saúde e não somente realizar um tratamento quando colesterol e triglicerídeos estiverem elevados. Desta forma, é possível prevenir aterosclerose, doenças coronarianas, infarto e outras enfermidades provenientes de alterações lipídicas.  

Em alguns países é difícil ou caro o consumo de peixe, ou até mesmo os hábitos da população não favorecem sua ingestão. “Para estas situações temos os suplementos dietéticos, como o óleo de peixe em cápsulas, que pode se tornar um agente terapêutico”, sugere a pesquisadora.

Próximos passos

– Estamos observando os receptores no músculo para entender se a alteração de lipídios pode ser decorrente deste órgão capaz de oxidar ácidos graxos, importante no metabolismo lipídico. Queremos entender melhor este mecanismo e como é a conversa dos ácidos graxos com o hormônio tireoideano e os receptores – aponta a professora. Planeja-se saber se há alteração da expressão do gene do receptor ou se ele está alterando outros co-fatores que modulam a expressão da enzima que concluíram estar bastante aumentada. “Enfim, estamos tentando destrinchar em nível molecular como se dão estas interações”, conclui Carmen.

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