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Edição 126
15 de maio de 2008

Argumento

O mundo da imaginação ajuda na recuperação de crianças

Tatiane Leal

Crianças rodeadas de livros, ouvindo histórias e folheando exemplares de literatura infantil. A cena, que parece ter lugar em uma biblioteca ou em uma escola, acontece diariamente no Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG). É o programa Biblioteca Viva, lançado em 2000 pelo Ministério da Saúde, há oito anos vem tornando mais colorida a vida das crianças internadas em hospitais pediátricos de 26 hospitais espalhados por dez estados brasileiros. No IPPMG, mais de 91 mil crianças já foram atendidas pelo programa, implantado em 2001, sob a coordenação da professora de biblioteconomia Cristina Paiva.

O programa é feito com voluntários, que dedicam uma hora por semana para ser um mediador de leitura, ou seja, alguém que lê histórias de literatura infantil para as crianças internadas. “Com a mediação de leitura, o voluntário aumenta a auto-estima daquela criança e a faz sonhar com os personagens e buscar a cura de sua doença, porque o herói do livro sofre, mas no final vence”, destaca a coordenadora do projeto.

Cristina Paiva acrescenta que, além de estimular o gosto pela leitura, o programa possibilita que a criança tenha direito de escolha em uma fase da vida - a doença – em que ela não está tendo escolha. “A criança doente não pode escolher ir para casa e para a escola, não pode se juntar aos irmãos, aos amigos e, se tiver que fazer uma cirurgia ou um exame, até mesmo sentir uma dor, isso terá que acontecer. Quando você realiza o simples ato de levar alguns livros até a criança e deixar que ela decida a história que quer ouvir, você está dando a ela a oportunidade de escolher”, ressalta Cristina.

Para ter essa relação prazerosa com as crianças, os voluntários do Biblioteca Viva têm um compromisso: não falar sobre a doença. “A internação é muito traumática para a criança. Desde então, tudo é muito focado em sua doença. E quando você chega para uma criança pela primeira vez com uma blusa colorida e uns livrinhos na mão, fica nítido na cabeça dela que você vai fazê-la rir, mas depois vai aplicar uma injeção”, exemplifica Cristina, que explica que quanto menos envolvimento o mediador de leitura tiver com a doença, mais estreita será sua relação com a criança e maior a confiança dela. “Já existe uma série de profissionais capacitados para tratar da enfermidade. O nosso papel é outro. Nós trazemos para a criança um momento lúdico, único”, completa.

Essa série de benefícios não atinge somente as crianças, mas toda a comunidade em volta: pais, profissionais de saúde e voluntários. “O mediador de leitura cria um ambiente calmo dentro da enfermaria. Ele apaga um pouco aquela impressão de que ‘estamos todos doentes’. E no fim todo mundo faz uma grande hora de lazer que é a hora da mediação”, emenda a coordenadora.  Freqüentemente, os pais prestam atenção nas histórias lidas para seus filhos ou para as outras crianças ao redor e acabam contagiadas por sua alegria. Além disso, muitas vezes os mediadores são convocados a acalmarem as crianças antes de algum procedimento médico, chegando a acompanhá-las ao centro cirúrgico.

Para os voluntários, o contato com as crianças é uma experiência incomparável.  “Para mim este projeto só traz benefícios. Melhora o meu estado de humor e minha saúde. Além disso, me faz enxergar que existem situações complexas, que paralisam a vida  das  pessoas, mas mesmo assim elas lutam, reagem. E isso me serve de exemplo”, afirma Érica Aragão Monteiro, mediadora de leitura no IPPMG há dois anos.

Érica, que cursa o 8º período da Faculdade de Letras, faz parte de um grupo de voluntários característico do programa no IPPMG: os próprios alunos da UFRJ. “Temos a felicidade de estar dentro de um campus onde existem diversos alunos de diferentes cursos. Às vezes um aluno tem uma aula de manhã e outra à tarde e fica com o tempo ocioso no meio. Por que não fazer um trabalho como o Biblioteca Viva, aqui mesmo dentro do campus?”, ressalta Cristina.

Para ser um voluntário, a única necessidade é a disponibilidade em torno de uma hora por semana, de 9 às 16 horas. Não há exigência de idade. O novo voluntário passa por uma sensibilização, que é uma conversa com a coordenadora do projeto Cristina Paiva, em que são passadas todas as informações necessárias. Cristina explica que os voluntários não precisam ter medo das primeiras mediações, pois no início vão acompanhados, só depois ficarão sozinhos com as crianças.

Os voluntários utilizam um acervo de mais de 2.000 livros. Parte foi obtida na época da implantação do programa, com o fornecimento do Ministério da Saúde. Além disso, editoras participam do projeto doando livros e uma ONG fornece revistas para colorir. A reitoria doa as camisetas amarelas usadas pelos voluntários. Cristina explica que o acervo é pensado cuidadosamente, de modo a estimular a criatividade da criança. “Nós trabalhamos com livros que não induzem a criança, mas permitem que cada uma interprete de uma forma”, afirma.

Essa prática da mediação de leitura desenvolvida no Biblioteca Viva é o tema de uma disciplina que Cristina Paiva ministra atualmente na Faculdade de Biblioteconomia da UFRJ, que fica no campus da Praia Vermelha. “O Biblioteca Viva, além de atingir seus objetivos dentro da unidade de saúde, fez com que a própria Universidade visse a necessidade de incentivar o aluno a ser um leitor e um mediador de leitura. Hoje capacitamos alunos da UFRJ para que possam implantar projetos de mediação de leitura não só em hospitais, mas em creches, asilos e comunidades carentes”, comemora a professora.

Cristina afirma que a biblioteca, como o nome diz, é viva de fato. “Os livros vão todos lá embaixo na enfermaria várias vezes por dia. Quebramos aquela imagem da biblioteca com os livros arrumados. Quer coisa melhor do que esparramar no chão livros de literatura infantil? É uma grande festa quando os mediadores se sentam no chão rodeados de crianças e livros. E é muito legal ver isso dentro de uma unidade de saúde.”

Para os voluntários, o melhor presente é o sorriso no rosto das crianças. “Percebo os benefícios no semblante, nos gestos. Como  uma mudança de  estado emocional  muito positiva,  um  desejo de querer  falar e mover-se”, completa a voluntária Érica.

Quem tiver o interesse em ser um voluntário ou quiser obter mais informações deve ligar para o telefone 2562-6100 das 9 às 16 horas e falar com Cristina ou Isabel ou mandar um email para bibiviva@ippmg.ufrj.br. Além do IPPMG, que fica na ilha da Cidade Universitária do Fundão, o programa Biblioteca Viva acontece em outros hospitais do Rio de Janeiro, que são o Instituto Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz, Hospital Municipal Jesus, o Hospital Getúlio Vargas Filho, Hospital Estadual Rocha Faria, Hospital Geral de Bonsucesso e o Hospital Universitário Pedro Ernesto.

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