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Edição 109
29 de novembro de 2007

Saúde e Prevenção

Ascite: os detalhes da barriga d’água

Marcello Henrique Corrêa

A gordura localizada pode parecer um problema comum, mas na verdade pode ser o primeiro sinal de doenças diversas. Essa é a ascite, popularmente conhecida como “barriga d’água”, manifestação caracterizada pelo desproporcional aumento do diâmetro do abdome. Quem explica os detalhes desse problema, que por si só não configura uma doença, é Cristiane Villela, médica do serviço de Hepatologia do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) e professora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina (FM) da UFRJ.

Causas

Segundo Cristiane, a ascite não é uma doença, mas sim uma manifestação clínica de um conjunto de doenças. “Existem algumas doenças, que, na sua evolução, podem causar ascite”, esclarece a professora, comparando o problema, por exemplo, à anemia. A médica alerta, dizer que está com ascite não é um diagnóstico do quadro do paciente. “A pergunta correta é: por que o paciente está com ascite?”, complementa.

A ascite é, basicamente, o acúmulo de líquido na cavidade abdominal. Segundo a Cristiane, esse processo pode ocorrer por dois motivos. O primeiro é referente a uma inflamação do peritônio (membrana que reveste a cavidade abdominal). “A inflamação do peritônio – causada por algumas neoplasias ou doenças infecciosas, como tuberculose –, ocasiona a saída de um líquido, que irá se acumular no abdome, aumentando seu tamanho”, detalha Cristiane.

A outra grande causa, segundo ela, ocorre com os pacientes que apresentam cirrose ou doenças cardíacas, ocorrendo o problema devido a uma diferença nas pressões dos vasos intra-abdominais ou cardíacos. “Esse processo leva à transudação de líquido e nada tem a ver com a inflamação de peritônio, mas sim por questão do aumento de pressão em alguns vasos do organismo”, esclarece. Além disso, há a diminuição da produção de proteína do fígado, o que também contribui para a acumulação de líquido, segundo Cristiane.

Uma característica problemática da ascite é o fato de ela somente poder ser detectada a olho nu quando o paciente já está com uma quantidade significativa de líquido na cavidade abdominal. “Quando a quantidade é pequena, apenas a ultra-sonografia é capaz de perceber o problema”, afirma a médica. Segundo ela, porém, há alguns sinais que podem ser observados, antes do aumento anormal do abdome. Entre eles, destacam-se o ganho progressivo de peso e inchaços em outras partes do corpo, como a perna. “Geralmente, a perna inchada precede ao aparecimento da ascite, nos casos de alterações de pressão hidrostática, como ocorre na cirrose e na insuficiência cardíaca”, comenta a professora.

Geralmente, o inchaço é progressivo e muito lento. Segundo Cristiane, a sensação de desconforto é mais comum quando a quantidade de líquido na cavidade abdominal é muito grande. Quando isso ocorre, há a distensão do abdome e o paciente pode ter uma série de sensações, como a de saciedade, devida à pressão sobre o estômago. Esse quadro pode levar o paciente a uma progressiva desnutrição.

Outra complicação passível de ocorrer é a chamada peritonite. “Quando há a infecção do líquido ocorre a peritonite espontânea, que pode acometer pacientes cirróticos. O líquido se infecta, através de bactérias, na maioria das vezes, intestinais, que migram para o líquido ascítico. Isso pode causar dor abdominal para esses pacientes”, explica a médica.

Diagnóstico e tratamento

Como a ascite é uma complicação causada por outras doenças, a primeira coisa para pensar em um tratamento é descobrir qual é a doença causadora do acúmulo de líquidos. A primeira medida consiste em uma pulsão do abdome, chamada paracentese. Baseado nos resultados desse processo, estuda-se o líquido ascítico. A partir daí, pode-se verificar o tipo de ascite em questão. Analisando a quantidade de proteína ou a presença de sinais de infecções, por exemplo, pode-se relacionar às possíveis causas do problema. Se for identificado, por exemplo, que a causa é tuberculose, o tratamento será para essa doença.

Quando existe uma resposta ao tratamento, nos casos de inflamação do peritônio, o líquido vai sendo reabsorvido aos poucos. No entanto, no caso de ascite causada por cirrose ou doenças cardíacas, Cristiane afirma que é preciso utilizar algumas medicações para eliminação do líquido, como diuréticos, em doses crescentes, monitorando o peso do paciente. A medição da circunferência abdominal também ajuda a controlar e avaliar a resposta ao tratamento.

Ainda, nos casos dos doentes mais graves, é necessário lançar mão de um outro tipo de tratamento, que consiste na retirada por completo do líquido. “Um paciente com uma ascite de grande volume, que não responde ao diurético, deve ser submetido a esse procedimento”, exemplifica a professora. Além disso, no caso de pacientes cirróticos, o transplante de fígado soluciona o problema, restabelecendo as pressões e o funcionamento normal do organismo. “Essa, contudo, é a última escala de gravidade. Geralmente, tratamos bem com o uso de diurético, apenas”, comenta Cristiane.

Depois de tratado, não é incomum o paciente que apresentava uma ascite volumosa precisar tratar uma hérnia da região umbilical. Segundo a médica, isso é referente a um quadro mais complicado, quando pode ocorrer a necrose da hérnia, entre outros agravantes. O paciente com uma ascite pequena, no entanto, precisa ter o cuidado apenas de ir ao médico periodicamente, para manter acompanhamento. “Nada impede que ele volte a ter ascite. Portanto, é preciso o acompanhamento para o resto da vida”, finaliza Cristiane.

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