Agência de Notícias da UFRJ www.olharvital.ufrj.br
Edição 101
04 de outubro de 2007

Faces e Interfaces

Vantagens e desvantagens de ser vegetariano


Priscila Biancovilli e Flávia Fontinhas

A União Vegetariana Internacional define vegetarianismo como “a prática de não comer carne, aves, peixes ou seus subprodutos, com ou sem uso de laticínios e ovos”. A adaptação alimentar é uma filosofia de vida adotada com os mais diversos objetivos, seja por determinação religiosa, pelo objetivo de ter uma dieta mais saudável ou, ainda, por consciência ecológica.

Entretanto, é necessário ter em vista as conseqüências dessa escolha. Por isso, para que a filosofia não seja prejudicial à saúde, é preciso o vegetariano obter de outras fontes os mesmos nutrientes encontrados nos alimentos excluídos do cardápio (como proteínas, vitaminas e minerais).

A disseminação progressiva desse estilo de vida na população tem alertado os especialistas. Afinal, até que ponto o vegetarianismo é benéfico? A fim de esclarecer essa questão, o Olhar Vital convidou Glória Valéria da Veiga, professora adjunta do Instituto de Nutrição Josué de Castro e Adolpho Milech, nutrólogo e endocrinologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filhoda UFRJ.

Glória Valéria da Veiga

Professora adjunta do Instituto de Nutrição Josué de Castro

“Na literatura existe a discussão sobre a dieta vegetariana, se é benéfica ou não para a saúde. Existem benefícios e malefícios. O principal benefício é o fato de os vegetarianos serem mais protegidos contra doenças cardiovasculares e doenças associadas ao excesso de gordura; uma vez que os alimentos de origem animal, como a carne vermelha, têm realmente maior quantidade de gordura, colesterol e ácidos graxos saturados, reconhecidamente associados a doenças cardiovasculares, hipertensão arterial, entre outras.

“Por outro lado, os vegetarianos têm maior risco de contrair doenças relacionadas à deficiência de alguns nutrientes essenciais à saúde, como o ferro e a vitamina B12, ligados à formação das hemácias e da hemoglobina; acarretando problemas como a anemia.

“Entretanto, é necessário ressaltar os diferentes graus de vegetarianismo. Por exemplo, os lactovegetarianos, que ingerem também laticínios, e os ovolactovegetarianos, que também consomem ovo e leite, são menos propensos a esse tipo de doença. Os vegetarianos que consomem somente vegetais são mais sucetíveis a estas doenças porque alimentos de origem animal são os que têm proteína de melhor qualidade, além de serem altas fontes de ferro e de vitamina B12.

“Há ainda outros pontos positivos, como o fato de as dietas vegetarianas dificilmente virem isoladas de outros comportamentos benéficos à saúde; como a prática constante de exercícios físicos, a não-ingestão de bebidas alcoólicas e o fato de não fumar. Como também há outros problemas: o fato de uma mulher vegetariana ao engravidar ocasionar problemas para seu filho; uma vez que todas as reservas de nutrientes, como o cálcio, o ferro entre outros, são insuficientes para o repasse da mãe ao bebê, através do leite materno.

“Enfim, os indivíduos que adotam esse tipo de dieta precisam buscar formas para repor os nutrientes essenciais perdidos. Em relação às proteínas, não existe nenhum alimento de origem vegetal com a qualidade da proteína animal; a proteína animal é de melhor valor biológico e possui todos os aminoácidos essenciais para o organismo. Mas nós brasileiros temos uma mistura maravilhosa no hábito alimentar: o arroz e o feijão, na qual os aminoácidos se complementam, repondo as proteínas necessárias. E, além disso, o indivíduo vegetariano pode obter essas proteínas no ovo, no leite ou também na soja, de boa quantidade protéica.

“Agora, em relação aos minerais, a reposição só pode ser realizada através de medicamentos. O cálcio é um exemplo: se a pessoa não ingerir fontes de leite não conseguirá suprir tudo o que precisa com os vegetais; os vegetais que possuem cálcio apresentam baixa disponibilidade e quantidade do mineral. Principalmente na fase da adolescência, quando o jovem está criando uma massa minerálica óssea importantíssima para a vida toda, esse mineral é indispensável. É bom ter em vista a osteoporose, prevista lá depois dos 40 anos, muito relacionada a essa massa formada na adolescência. Por isso, não adianta ficar se enchendo de cálcio depois para tentar compensar o que foi perdido. É bom o indivíduo continuar ingerindo, mas se ele já fez uma massa inadequada na fase do crescimento, o risco de osteoporose na vida adulta é muito maior.

“Outro exemplo é o ferro, só reposto pelos vegetarianos, devidamente, através do sulfato ferroso; não há alimento de origem vegetal que forneça a mesma quantidade de ferro de um alimento de origem animal. Além disso, o ferro de origem vegetal não é tão biodisponível, ou seja, nem tudo é aproveitado.

“Acho a alimentação tão rica que é inadequado as pessoas limitarem essa diversidade. Depois ainda terão de consumir remédios. É claro, o vegetariano pode ter um estilo de vida saudável, mas o onívoro também pode. Não é porque come carne que não vai, por exemplo, praticar atividades físicas. Ele pode controlar tudo com bom senso. Por isso, eu não gosto do ‘isso é proibido’, ‘isso não se come’.

“Eu não recomendaria, em um consultório, para crianças e adolescentes em hipótese alguma. Sou realmente contra; é uma fase de crescimento; essas fontes alimentares animais são importantíssimas. Agora na fase adulta, se o indivíduo souber fazer as combinações adequadas, e se usar suplementações medicamentosas, ele pode se manter saudável. Mas numa opinião pessoal, é melhor a pessoa comer uma maior variedade de alimentos.”

Adolpho Milech

Nutrólogo e endocrinologista do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho

“Esta dieta vegetariana não tem nenhum embasamento científico. Respeito quem leva este estilo de vida por motivos religiosos ou por filosofia, mas não pelos benefícios à saúde que a falta de ingestão de carnes supostamente gerará. Para provar que o vegetarianismo não necessariamente significa uma vida saudável, posso citar o exemplo da Índia, país em que o índice de diabéticos é enorme.

“Quando falamos dos componentes nutricionais e protéicos dos vegetais, podemos afirmar que uma dieta sem carnes pode ser bastante completa. A soja, inclusive, pode suprir as necessidades de proteínas. Geralmente, a preocupação dos vegetarianos é esta, de adquirir alguma doença pela falta de proteínas. Eles devem ter duas preocupações, basicamente: a primeira, a vitamina B12 não existe nos vegetais, sua falta pode gerar anemia megaloplástica, por exemplo. A segunda, o ferro encontrado nos vegetais não é tão bem absorvido quanto o animal.

“Não há nenhum estudo científico mostrando que pessoas alimentadas apenas de vegetais vivam mais. Esta é uma falácia. Outro argumento bastante usado pelos vegetarianos é o fato de a carne possuir uma série de hormônios e antibióticos, injetados nos animais durante a criação, tóxicos ao ser humano. Não existe comprovação científica de isto compor a carne. Já ouvi dizer que o animal abatido libera adrenalina, algo que poderia tornar o homem violento. Esta é uma bobagem. A absorção gástrica de adrenalina é praticamente zero.

“Devemos esclarecer alguns mitos em relação à ingestão de carnes. A carne branca é comumente ingerida por alguns vegetarianos, por ser considerada mais saudável. Pele de galinha possui mais colesterol que 100 gramas de filé mignon sem gordura. O filé mignon sequinho, aliás, tem uma quantidade de colesterol similar a um salmão.

“O mais importante é o controle, em qualquer tipo de alimentação. Não há, de fato, nenhuma comprovação de uma dieta vegetariana ser superior a uma dieta balanceada, com carnes. Existes vegetarianos gordos e diabéticos, da mesma forma que inúmeras pessoas consumidoras de carnes levam uma vida completamente saudável.

“Se me pedissem para indicar uma dieta vegetariana, eu o faria. A pessoa tem o direito de escolher o que ela quer. Claro, eu daria as devidas advertências. Faria o cálculo calórico e o aconselharia a tomar vitamina B12. Caso a mulher tenha menstruação intensa, deve tomar suplemento de ferro. No mais, não faço nenhuma objeção.”

Anteriores