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Edição 098
13 de setembro de 2007

Saúde em Foco

A invisível ameaça química

O contato com substâncias poluentes pode causar alterações hormonais.

Por Carlos Albuquerque, do jornal O Globo

Um inimigo invisível está no ar. E também na terra e na água. São os disruptores hormonais, substâncias químicas — boa parte delas, pesticidas —, cuja presença no ambiente, inclusive o urbano, pode afetar a população sem que ela perceba. O alerta é do professor de microbiologia da UFRJ Tomas Langenbach, um dos poucos a estudar o assunto no Brasil. Um recente estudo com gestantes, feito por pesquisadores da Universidade de Granada, na Espanha, alertou para esse perigo, lembrando que mais de 110 mil substâncias químicas foram criadas pelo homem desde o início da Revolução Industrial. A maioria é de poluentes, que podem ser absorvidos pelo corpo humano inadvertidamente.

Uma das mais assustadoras conseqüências dessa contaminação silenciosa foi a descoberta de que 100% das 308 grávidas analisadas pela pesquisa — realizada entre 2000 e 2002 — terem, pelo menos, um tipo de pesticida na placenta, camada que deveria proteger o feto. Segundo Langenbach, os pesticidas começaram a ser utilizados nos anos 40, mas somente na década de 90 se percebeu que a ingestão, por muitos anos consecutivos, de alimentos contendo agrotóxicos, mesmo em baixas concentrações leva a um acúmulo que pode ser responsável por alterações hormonais.

— Esse acúmulo pode causar alterações, sobretudo sexuais, como redução de fertilidade do homem, assim como maior precocidade da puberdade feminina — explica ele. — Os disruptores hormonais atuam alterando o processo de formação do feto e seu desenvolvimento posterior. Seus efeitos dependem de que substâncias são e de que forma atuam no organismo.

Entre essas substâncias, estão as dioxinas, PCBs, flatalatos e alquilfenóis. Para o leigo, podem parecer palavras distantes, de uso exclusivo do meio científico. Mas, na prática, elas estão mais próximas do que parece. PCBs fazem parte da composição de venenos domésticos, tintas e vernizes. Alquilfenóis estão presentes em diversos cosméticos, como xampus e tintas para os cabelos. Já os flatalatos são usados como amaciantes de plásticos, quebrando a rigidez de sua moléculas, sendo utilizados na fabricação de garrafas e brinquedos.

— Para tornar os plásticos maleáveis utiliza-se os flatalatosm que são moléculas com propriedade de disruptores hormonais — lembra Langenbach.

O estudo na Espanha mostrou que todas as crianças nasceram sem problemas e têm se desenvolvido normalmente. Segundo os pesquisadores, somente uma análise a longo prazo poderá dizer se as crianças sofreram algum tipo de dano ainda não aparente. Outras pesquisas feitas nos EUA e na Dinamarca, porém, revelaram que crianças que tinham grandes quantidades de substâncias químicas nos seus cordões umbilicais nasceram menores e com uma cabeça de proporções reduzidas.

Para Langenbach, um dos maiores problemas do combate a esse inimigo invisível é a sua difícil identificação.

— Essas substâncias só podem ser detectadas com equipamentos sofisticados em mãos de especialistas. Além disso, existe uma dificuldade de se estabelecer as relações de causa e efeito porque usamos uma série de substâncias simultaneamente. Do ponto de vista médico, é difícil responsabilizar uma determinada molécula por um quadro de sintomas. O reconhecimento deste problema não é espetacular e, portanto, não tem um forte apelo de mobilizar emoções fortes e com isto reações políticas.

A solução, diz o professor da UFRJ, seria restringir a utilização desses produtos.

— A legislação brasileira em relação a tais produtos precisa avançar mais. No caso dos agrotóxicos, esse avanço teria que ser em direção a uma agricultura sustentável. O problema é que essa restrição interfere com os interesses da indústria química. Mas essa mesma indústria dá mostrou capacidade de enfrentar restrições desenvolvendo produtos novos, com bons resultados.

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