www.olharvital.ufrj.br
Edição 088
5 de julho de 2007
Cientistas brasileiros foram buscar na natureza a inspiração para desenvolverem uma nova substância contra o câncer que, em teses preliminares em laboratório, se revelou mais eficaz e menos tóxica do que os produtos usados atualmente como quimioterápicos. Publicada na revista européia “Biorganic Medicinal Quemistry”, a pesquisa parte agora para a segunda etapa, que consiste em testar os efeitos do produto em camundongos.
A partir de estudos sobre o uso na medicina popular do ipê (Tabebuia) já se conhecia a atividade anticancerígena de três substâncias dessa planta: lapachol (que chegou a ser usado clinicamente), alfa-lapachona e beta-lapachona.
– As pesquisas de um modo geral partem de substâncias já conhecidas nas plantas por meio das tradições indígenas, do conhecimento oral que passa de família em família – explica Marcos Moraes, coordenador do Programa de Oncologia da UFRJ, uma rede integrada de pesquisas sobre o câncer.
– Um segundo momento é a síntese em laboratório dessas substâncias a partir do conhecimento da forma da molécula, da sua composição.
No caso da nova substância, estudada nos laboratórios de Química Biorgânica e de Imunologia da universidade, os cientistas foram além e aperfeiçoaram a molécula, tornando sua forma sintética mais eficiente que a natural.
- Nos inspiramos na substância natural e fizemos uma parecida com ela em laboratório, alterando sua estrutura para aprimora-la – conta o pesquisador Paulo Roberto Ribeiro Costa, coordenador do estudo. – Já havíamos observado, por exemplo, que os produtos naturais do ipê eram inativos em células de leucemia resistentes a diversos fármacos. Mas a sustância que preparamos se mostrou ativa, inclusive em células de câncer de pulmão, muito difíceis de serem combatidas com tratamento quimioterápico. Portanto, as modificações possibilitaram que a molécula apresentasse mecanismos de ação um pouco diferentes, o que permitiu driblara resistência dessas células.
A nova molécula criada pelos cientistas tem como alvo justamente células de leucemia, que apresentam o que se chama de resistência a múltiplas drogas. Quando isso ocorre, os tratamentos quimioterápicos tradicionais passam a não ter efeito.
A substância mostrou também baixa toxicidade.
– Os testes em laboratório com células sangüíneas revelaram que ela alcança as células cancerígenas, mas preserva as sadias – diz Costa.
O próximo passo é testar a nova molécula em modelos vivos, no caso camundongos.
– Vamos testar a substância em animais com câncer para ver se no modelo vivo conseguimos obter os mesmo resultados constatados em cultura.
Rede contra o câncer reúne mais de cem pesquisadores de instituições do Rio
Para os pesquisadores, o fato de estarem integrados a uma rede de pesquisa faz toda a diferença.
– A rede é um ovo de Colombo – compara Marcos Moraes.
– Porque ela oferece instrumentos mais simples para os pesquisadores se comunicarem entre si no momento em que as pesquisas ainda estão sendo feitas. Esse é o grande segredo, possibilidade de acompanhamento das pesquisas como um todo.
Criada há seis anos, a rede conta hoje com mais de cem pesquisadores de instituições como o Instituto Nacional do Câncer, UFRJ, Uerj, UFF reunidos em 27 linhas de estudo sobre o câncer.
O Globo – 04/07/2007