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Edição 059
25 de outubro de 2006

Faces e Interfaces

Ainda há discriminação da mulher na ciência?

Por Mariana Elia e Julia Paula, da Agência de Noticias - Praia Vermelha

O Olhar Vital procura, mais uma vez, abordar questão do lugar da mulher no meio científico. As estatísticas mostram que mesmo em igualdade no nível de graduação, as mulheres não dividem o mesmo espaço em cargos de liderança e bolsas de pós-graduação científicas. Por que ocorre essa defasagem? Por que a imagem masculina ainda domina os centros de pesquisa? Poderíamos dizer que isso ocorre apenas por uma herança histórica e que, aos poucos, assistiremos a uma nova configuração?

Conversamos com Clarisa Palatnik, professora do Instituto de Microbiologia Professor Paulo de Góes (IMPPG), e Maíra Gomes, estudante do Instituto de Biologia e professora do projeto Sacis, Saber Admirar as Ciências para Inclusão Social, para compreender um pouco mais sobre o assunto.

 

Maíra Gomes

Estudante do Instituto de Biologia da UFRJ e professora do Sacis

“Sacis é um projeto que atende estudantes do Ensino Médio, na maioria do terceiro ano, e atua como uma aula de reforço aos alunos em Matemática, Biologia, Química e Física. Trata-se de um projeto de extensão, sediado no Instituto de Química e coordenado pelo professor João Massena. A idéia do projeto veio a partir da observação do desinteresse de jovens por ciências, que sempre a consideram difícil e inalcançável. O Sacis é um estímulo a gostar de ciências, porque a pessoa que gosta, se interessa e se inclui socialmente, já que busca nela o seu lugar na sociedade.

Seria injusto eu dizer que há alguma prevalência, seja de homens ou mulheres, no nosso curso. Acredito que qualquer diferença tenha relação com a idade dos alunos do Sacis. São adolescentes, entre 16 e 19 anos, e qualquer análise depende do grau de maturidade em que cada um se encontra. Existe, realmente, uma tendência biológica de desenvolvimento feminino antes do masculino, quer dizer, a maturidade chega primeiro para as meninas. Por conta disso, é mais provável uma menina de 17 anos demonstrar interesse no vestibular e maior preocupação com o futuro. Essa atenção também vai ocorrer com os meninos, é claro, mas o processo costuma ser mais lento.

Dessa forma, eu acho muito tendencioso concluir que as meninas se interessam mais, por exemplo. A inteligência é igual, o potencial é igual, as capacidades são iguais, mas cada um se descobre no seu tempo. E é também isso que eu vejo na minha formação acadêmica. Não acredito na discriminação da mulher na ciência, pelo contrário, percebo uma relação bastante equivalente entre professores e professoras, pesquisadores e pesquisadoras.

Em Biologia, na graduação, existe até uma maioria de estudantes feminina. Em relação a níveis hierárquicos superiores, penso que as diferenças têm diminuído bastante. Eu, por exemplo, tenho muitas professoras. E a quantidade que tem entrado na faculdade, e de estudantes na pós-graduação, é bem maior que no passado.
Se essa diferença existe, é por conta de um ranço histórico, mas não é tão visível na prática diária. A igualdade virá com o tempo, não é agora que a gente percebe esse quadro, que ainda está sendo construído”.

Clarisa Palatnik

Professora-titular de Leishmaniose canina do Instituto de Microbiologia Professor Paulo Góes (IMPPG)

“Aqui no Instituto, há um predomínio notório de mulheres, e acredito que, de uma forma geral, nas instituições de pesquisa brasileiras é assim também. Estudei na Argentina, Israel e Brasil e nunca, em lugar nenhum, sofri discriminação, ao contrário, as mulheres são valorizadas e bem sucedidas. Em Israel, estudei em uma Faculdade, onde os homens eram maioria. Ainda assim, não senti nenhum desrespeito ou provocação. A desvalorização feminina no mercado de trabalho teve seu lugar há trinta anos atrás, hoje a concorrência é pela qualidade.

Diante dessas estatísticas, não sei nem o que dizer, parece que trabalho em outro mundo. Recentemente, apenas, que homens voltaram a se interessar por Microbiologia, a procurar nossos laboratórios. A primeira vez que soube de alguma reclamação por discriminação foi há pouco tempo atrás, por uma professora de outro Instituto. Pela minha experiência, de mais de vinte anos na universidade, não há discriminação ou defasagem de mulheres na ciência.

É verdade que as mulheres ainda têm que dividir seu tempo entre o trabalho e a vida doméstica, pois se um filho adoece, é a mãe, provavelmente, que faltará o trabalho. O sistema sócio-econômico brasileiro não permite que a mulher se dedique à profissão. O que eu observo, por exemplo, é que muitas das minhas alunas estão preferindo casar e formar família depois de estabilizadas na profissão. Se não têm filhos aos vinte, optarão por tê-los aos quarenta anos.

Além disso, acredito que esse tipo de argumentação, que apela a diferenças de gênero, raça ou ideologia, faz crescer um sentimento de fraqueza, como se a mulher ou o negro não tivesse as mesmas capacidades e potenciais. Minha opinião é bem diversa, uma vez que vejo as mulheres mais organizadas, mais espertas e, muitas vezes, mais bem sucedidas no que fazem”.

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