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Edição 050
24 de agosto de 2006

Ciência e Vida

Os mais graves primeiro

MS modifica critério de ordem da fila de espera para transplantes de fígado

Taisa Gamboa

Atualmente, mais de seis mil pessoas estão na fila para um transplante de fígado. A espera de, no mínimo, três anos, pode ser fatal. Cerca de 40% dos doentes morrem antes do procedimento. A fim de minimizar esse problema, o Ministério da Saúde (MS) aprovou a medida que muda os critérios de ordem da fila.

Desde julho deste ano, os transplantes de fígado seguem uma nova regra. A fila por ordem de chegada (critério utilizado desde 1998) deixou de existir para dar lugar ao critério de gravidade. A iniciativa surgiu de um grupo de médicos especialistas que verificavam a ocorrência de transplantes em pacientes que estavam relativamente bem, enquanto outros morriam na fila de espera. “É muito mais lógico transplantar alguém que tem um caso mais grave, do que quem chegou primeiro”, opina Joaquim Ribeiro, médico coordenador da equipe de transplantes do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF/UFRJ).

De acordo com ele, ao contrário do transplante de outros órgãos, que segue critérios de compatibilidade, por exemplo, o de fígado funciona a partir da gravidade do caso de cada paciente. Enquanto é possível, o doente passa pelo tratamento adequado, recebendo medicamentos paliativos. Mas quando há a perda de função do fígado, não há outra solução, a não ser o transplante. E, enquanto esperam na fila, os pacientes podem morrer.

Uma fórmula matemática com base logarítmica disponibilizada pelo Ministério da Saúde permite estabelecer determinados níveis de gravidade. A partir de três exames específicos, a Bilirrubina, a Creatinina, e o INR (índice de coagulação do sangue), um sistema computadorizado consegue prever a mortalidade iminente dos pacientes nos próximos três meses, de acordo com uma gradação pré-estabelecida. Quanto maior o nível, maior a chance de a pessoa morrer. São esses que estão pulando a fila dos transplantes.

- Para deixar em dia a agenda, vários doentes que estavam com exames marcados para o fim do ano, ou para outras datas, estão sendo chamados para o hospital. Eles têm que fazer os exames perto da época de operação para que não percam a validade. Essa realocação de pacientes tem causado um certo tumulto nos ambulatórios, mas nenhum paciente reclama. - destaca Joaquim Ribeiro.

O único problema é que esse novo modelo engloba 83% dos pacientes que necessitam de transplante, a maioria com cirrose. Mas não consegue prever a mortalidade dos 17%, que têm gravidade por outros motivos não incluídos, como o Câncer e algumas doenças metabólicas. De acordo com a lei que em vigor, esses pacientes com Câncer e outras patologias recebem uma pontuação extra no resultado final da fórmula do MS. Dessa forma, são automaticamente realocados no início da fila.

Segundo o especialista do HU, existem outras patologias que ficarão de fora da reorganização, pois é difícil prever todos os casos. É por isso que o sistema recém-implantado deveria ter sofrido um período de transição, junto com o antigo modelo. Como isso não foi feito, o que resta agora é fazer as adaptações necessárias para evitar injustiças. Pacientes que já estavam há quatro anos na fila, que não têm gravidade por esse novo modelo, mas por outros motivos, como a Cefalopatia, ou sangramento digestivo, deveriam ter seus casos reanalisados. Mas como não o foram, estão entrando na justiça.

Apesar de garantir a segurança do ponto de vista médico e evitar injustiças, o novo modelo não diminuirá a fila dos transplantes. O maior problema é a falta de captação de órgãos no país. O número ainda é muito menor que a demanda e a conscientização da população é fundamental para evitar mais mortes. Se essa medida não for implantada, qualquer que seja o modelo adotado para a fila, sempre haverá mortalidade. Mesmo com esses problemas, o HUCFF faz, em média, 50 transplantes de fígado por ano, cobrindo cerca de 65% das operações realizadas no estado do Rio de Janeiro. A universidade tem planos de ampliar o número de cirurgias para 70 ao ano.

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