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Edição 045
20 de julho de 2006

Ciência e Vida

Vacina contra Leishmaniose

Mariana Elia

As leishmanioses são um conjunto de doenças infectocontagiosas causadas por um protozoário, do gênero Leishmania, que se aloja em mosquitos e mamíferos. A doença é classificada por zoonose, que  são transmitidas dos animais para os homens, bem como seu oposto. O mosquito, apenas os flebotomíneos, da ordem Díptera, é hospedeiro intermediário. Os cães são especialmente suscetíveis a esse tipo de infecção e, por ser comum a sua domesticação, são também responsáveis pelo alastramento da doença na população humana.

            Em 1989, porém, essa história começou a mudar. A professora Clarisa Palatnik, que se tornou esse mês professora-titular de Leishmaniose canina do Instituto de Microbiologia Professor Paulo Góes, iniciou sua pesquisa para desenvolvimento da vacina canina contra Leishmaniose no final dos anos 1980. “Nessa época, quando defendi minha tese de doutorado, aprendi a isolar glicocomplexos, que são moléculas que contêm glicídios, do parasita que se chama leishmaniose romane”. A professora acrescentou adjuvantes, compostos que ajudam a estimular a resposta imune, e iniciou o processo de formulação da vacina. “Se controlássemos a infecção nos cães, controlaríamos a infecção nos humanos”, diz Clarisa.

            A vacina foi desenvolvida e em 1999 e a UFRJ assinou um contrato com uma empresa fabricante de vacinas veterinárias para fabricá-la industrialmente. Desde então, a universidade recebe recursos de royalties e do contrato. Sob o nome de Leishmune®, a vacina é comercializada desde 2003, mas a professora reclama de dificuldades enfrentadas com o Ministério da Saúde. Segundo ela, o governo tem a obrigação de comprar e distribuir a vacina nas cidades afetadas, mas o Ministério da Saúde tem colocado impedimentos, como adiar os testes necessários. “O Brasil tem muita inovação no desenvolvimento de vacinas, mas muito pouca aplicação. Existe muita resistência em usar produtos novos. Basta lembrar de Oswaldo Cruz e a Revolta da Vacina”, compara a professora.

            A Leishmune® é a primeira vacina no mundo a ser aprovada contra a Leishmaniose e o Ministério da Agricultura já aprovou e renovou a licença para aplicação em cães sadios. Os resultados são bastante satisfatórios. Verificou-se 97% de proteção em animais vacinados e ensaios de campo e 80% de eficácia vacinal (cálculo que associa os animais-controle e os animais vacinados para estabelecer uma perspectiva de resultado efetivo). A professora explica que com apenas 25% da população canina protegida, o impacto é considerável na evolução da epidemia.

            - Até 1993, considerava-se que era uma doença típica das regiões Nordeste e Norte (cerca de 90% das ocorrências nessas regiões), mas ao longo dos últimos 13 anos o perfil mudou, principalmente porque houve urbanização da doença, causado pela migração das pessoas em busca de trabalho, diz a professora.

            Foi o que aconteceu nas cidades no caminho de Mato Grosso a São Paulo. Já havia uma epidemia forte no Paraguai e no estado do Mato Grosso, mas agora ela se alastrou ao norte de São Paulo, por conta da construção da rodovia Marechal Rondon. Primeiro a doença chega à população canina e, após cerca de cinco anos, os homens são afetados. A quantidade de mosquitos vetores também é fundamental para a o sucesso da epidemia. “O Rio de Janeiro tem sorte, pois não há muitos mosquitos flebotomíneos para garantir o crescimento de um surto de Leishmaniose”, diz Clarisa.

Os próximos passos da pesquisa, que conta com a participação da professora Luzineide Tinoco, do Núcleo de Pesquisas de Produtos Naturais (NPPN), e de Daniel Figueroa, do Instituto Militar de Engenharia (IME), agora são incentivar o maior uso da vacina, inserir um marcador, aprimorar a ação dos adjuvantes e desenvolver uma vacina sintética, que ataca somente a enzima utilizada pelo parasita para quebrar a base do DNA e, com isso, se replicar. O marcador auxiliaria na campanha de controle porque seria um diferenciador entre os cães vacinados e não vacinados. “Seria a inserção de uma proteína irrelevante, como por exemplo, anti-soja. A sorologia distingue se há essa proteína, verificando a vacinação do cão”, explica a professora.

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