• Edição 136
  • 24 de julho de 2008

Argumento

Por uma avaliação mais completa da Síndrome de Down

Marcello Henrique Corrêa

Desde que foi descrita, em 1862, a síndrome de Down desperta grande interesse de pesquisadores de diversas áreas. Quase 200 anos depois do cientista britânico John Langdon Down identificar os sintomas da trissomia do cromossomo 21, ainda há muito o que descobrir e estudar a respeito, para garantir aos portadores uma vida com mais qualidade e mais saudável.

Essa é a motivação do estudo que começou este ano no Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG) da UFRJ. O projeto, que conta ainda com a colaboração da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) e do Instituto de Psicologia (IP), consiste em colher dados sobre o perfil cineantropométrico de crianças e adolescentes portadores da síndrome. Isso significa, basicamente, avaliar condições físicas e neuromotoras, de jovens de 7 a 18 anos, pacientes do IPPMG.

Segundo Vinícius Oliveira de Barros, mestrando em Clínica Médica que coordena o projeto, ainda não havia, na literatura especializada, um trabalho que fizesse uma avaliação completa desses casos, principalmente do perfil neuromotor. A professora Márcia Ribeiro, do departamento de Genética Clínica do IPPMG e uma das orientadoras da pesquisa confirma a importância do estudo desses dados. “É fundamental saber o nível de comprometimento neurológico, pois este pode interferir não só no aprendizado, como em qualquer atividade que o portador realize”, comenta.

Os números deixam claro que é necessário estabelecer estratégias para melhorar o desempenho dessas crianças e jovens. O teste da régua, por exemplo, consiste em soltar uma régua de 50 cm no ar e pedir para que a criança a segure antes que o objeto caia no chão. Quanto menor o resultado em centímetros, melhor é o desempenho. Para esse tipo de teste, a média entre meninos e meninas é de aproximadamente 40 cm, ou seja, a régua estava quase caindo quando as crianças foram capazes de segurá-la.

Obesidade e sedentarismo

Além da preocupação com as respostas neuromotoras, combater o excesso de peso é outro foco da pesquisa, justificado pela forte tendência à obesidade identificada entre portadores da síndrome. Vinícius de Barros explica que ainda não se sabe ao certo a que se deve essa tendência, mas um misto de fatores biológicos e sociais pode ser uma resposta. “De acordo com a literatura médica, pode ser ou um traço característico da população ou também decorrente da inatividade física. Mas, além disso, o que acontece é que unindo-se às limitações das habilidades motoras, há o preconceito da sociedade. Dessa forma, eles ficam cada vez mais ‘presos’ em casa e quanto mais eles ficam em casa, menos atividades fazem e a tendência de um acúmulo de gordura aumenta”, explica Barros. Quanto a isso, os resultados apontam que cerca de 50% das crianças ficam mais de três horas em atividades sedentárias, como assistir a TV ou jogar videogame, apesar de a grande maioria das crianças avaliadas afirmarem que praticam algum tipo de atividade física.

Para Fátima Palha, professora da Escola de Educação Física que também orienta o projeto, há um desequilíbrio entre calorias gastas e ingeridas e, portanto, a atividade física deve ser mais estimulada. “Sabemos hoje em dia que a atividade física é extremamente benéfica a vários fatores. Previne uma série de doenças, elimina colesterol, melhora a circulação, a respiração, a cardioatividade, entre outros benefícios”, defende a professora. “Como não há nenhum estudo feito com pessoas com síndrome de Down, acho que poderemos propiciar a essas crianças e jovens uma condição de melhoria da qualidade de vida direcionada especificamente às condições que eles apresentam”, completa a professora.

Na escola

O grupo não tem nenhum vínculo com as escolas, mas acredita que, no futuro, os dados desse estudo possam otimizar o trabalho feito com as crianças e adolescentes, durante as aulas de Educação Física. “É preciso ter um cuidado especial. Por exemplo, a criança portadora apresenta uma hipermobilidade articular, portanto o professor precisa estar ciente disso, já que certas atividades não são recomendadas devido a isso. Atividades como cambalhota e rolamento podem ser indicadas para uns, mas para outros não”, comenta Vinícius.

– Essa pesquisa vai ser uma contribuição grande porque aacontece dentro de uma Universidade, na formação de futuros professores. Na medida em que conseguirmos implantar um projeto de atividade física na EEFD para os pacientes do IPPMG, contribuímos muito com este segmento da sociedade e com a formação de nossos futuros professores –, conclui Fátima Palha.