• Edição 134
  • 10 de julho de 2008

Por uma boa causa

Fumacê causa danos ao meio ambiente

Priscila Biancovilli

A passagem dos carros ditos “fumacê” foi interrompida no início de 2008, na cidade do Rio de Janeiro, por determinação do prefeito César Maia. Na época, alegou-se que a substância provocaria um desequilíbrio ambiental, por matar pequenos insetos além do mosquito da dengue. Afinal, a pulverização do inseticida Malathion – usado para este fim – traz mais benefícios ou prejuízos para a natureza e a sociedade como um todo? Este é o assunto da nossa segunda matéria do especial Meio Ambiente.

Características

O fumacê é um veneno em forma de óleo, transformado em gotículas por uma máquina especial que o espalha pelas ruas. Esse veneno cobre todas as superfícies, como telhados, plantas, janelas e gramados. Em um dia de chuva, o material é “varrido” destes locais e cai nos leitos d’água (rios e lagos, principalmente). Tem-se então o envenenamento destes locais, que resulta na morte de micróbios e pequenos insetos, prejudicando o equilíbrio ambiental deste sistema. “Os peixes, que dependem de animais menores para se alimentar, também morrerão. Partindo para o ambiente terrestre, os pássaros sofrerão um grande impacto negativo, pois os seres vivos de que se alimentam, como besouros e formigas, não existirão em quantidade suficiente”, explica o professor Maulori Cabral, do departamento de Virologia do Instituto de Microbiologia da UFRJ.

De acordo com Maulori, o fumacê não diminuiria os casos de dengue durante a última grande epidemia no verão de 2008. “Os mosquitos que agora existem são descendentes daqueles que, no passado, resistiram aos primeiros fumacês. Testes feitos em laboratório mostraram que a eficiência desta substância chegava próxima a 100%. Porém, alguns sobreviviam, e estes insetos acasalavam e deixavam filhotes, que se proliferam até hoje. Ensaios feitos em laboratório mais recentemente demonstraram que a maior parte dos mosquitos não morre mais com o fumacê.”

A criação de um possível novo veneno não surtirá os efeitos desejados, pois, por mais que no início haja uma alta eficiência, com o tempo os mosquitos adquirirão resistência a ele. “Toda vez que existe uma barreira seletiva, se destacam aqueles organismos geneticamente diferentes, presentes no meio da população em proporção ínfima. Essa regra existe para todos os seres vivos, desde o micróbio até o ser humano”, destaca Maulori.

Muitas pessoas costumam fechar portas e janelas ao perceber a chegada do fumacê, em uma atitude julgada positiva pelo professor. “Esse é um veneno que se acumula nas gorduras do corpo, e pouco se sabe sobre seus efeitos tóxicos a médio e longo prazo. Esse produto, apresentado inicialmente como uma solução promissora, pode gerar conseqüências desastrosas.”

Maulori faz questão de afirmar que a destruição e desequilíbrio do meio ambiente provocados pelo homem podem gerar conseqüências desastrosas às gerações seguintes. “Meio ambiente implica em conviver harmoniosamente com a natureza. Se você fizer bem a ela, ela te fará bem. Se você tratá-la mal, ela te cobra com juros e correção monetária”, finaliza.

Dengue no Rio

A última epidemia de dengue no Estado do Rio de Janeiro foi considerada a mais violenta dos últimos tempos. De acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde, a doença causou mais de 30 mil vítimas e 31 mortes, de janeiro a março de 2008, apenas na cidade do Rio de Janeiro. No centro desta crise, causou polêmica a decisão do prefeito César Maia de proibir a passagem dos chamados carros fumacê, anteriormente bastante utilizados como forma de combate a mosquitos transmissores de doenças.

Apesar da recusa do prefeito carioca em aplicar o produto nas ruas da cidade, algumas cidades da região metropolitana organizaram mutirões da dengue e aderiram ao fumacê. No último mês de abril, por exemplo, o “Mutirão da Cidadania” visitou 96 comunidades carentes do Estado do Rio de Janeiro, e o carro fumacê circulou por todas elas.