• Edição 118
  • 20 de março de 2008

Saúde e Prevenção

Siso: um estranho em sua boca

Marcello Henrique Corrêa

Falta de espaço pode ser considerado o problema chave para o, muitas vezes doloroso, processo de erupção do terceiro molar. Popularmente conhecido como siso, esse dente pode causar muita dor aos jovens entre 17 e 20 anos – idade em que o processo costuma começar.

Segundo especialistas, o problema é que a arcada dentária já não suporta tantos dentes como na época de nossos ancestrais. “Antes, o terceiro molar era normal na cavidade bucal. Com o aumento da massificação da alimentação e do uso cada vez menor da musculatura, a boca tendeu a diminuir”, explica Sonia Groisman, professora da Faculdade de Odontologia da UFRJ.

Tudo indica que o problema não acontecia com os pré-históricos, por exemplo. Para o tipo de alimento que se comia, uma mastigação poderosa era necessária, ao contrário dos dias atuais. “Hoje, cozinhamos os alimentos, não se come coisas cruas, por exemplo. Isso leva a um menor exercício da musculatura e um menor desenvolvimento da arcada”, esclarece a professora.

Groisman explica que a dor sentida durante a erupção do siso pode estar relacionada a bactérias e outros problemas, decorrentes da falta de higienização. “Quando ele erupciona, às vezes o paciente não consegue higienizar lá atrás, justamente pela falta de espaço. Com isso, a pele que cobre o dente, juntamente com o acúmulo de placa, faz com que a gengiva inflame”, detalha.

O acúmulo de bactérias está diretamente relacionado ao mau posicionamento do terceiro molar. Quando o dente começa a nascer, ele está em uma posição de infra-oclusão, isto é, abaixo da linha de oclusão (quando os dentes se encaixam perfeitamente). “Quando qualquer dente está em infra-oclusão, é mais fácil que ocorra acúmulo bacteriano. É preciso, então, ter o máximo de cuidado com limpeza”, alerta a dentista.

O que fazer com o siso?

Como é comum o terceiro molar ficar incluso, ou seja, não erupcionar totalmente, é necessário, então, encontrar uma maneira de lidar com o siso. As principais opções são a extração e a tentativa de tratamento com aparelho ortodôntico. “Se o terceiro molar estiver ‘deitado’ dentro do osso, não há alternativa. Se ele estiver ‘em pé’, mas torto, há a possibilidade de fixá-lo com o aparelho ortodôntico e consertar”, avalia Sonia Groisman.

Já Ednilson Porangaba, diretor da Faculdade de Odontologia da UFRJ, é enfático: “A extração é a melhor opção. O terceiro molar, assim como o apêndice, por exemplo, é considerado um órgão vestigiário, um órgão que está em extinção”, considera.

Para Groisman, o terceiro molar pode ser útil, nos casos em que o paciente perde outros dentes, como o primeiro molar. “Quando há essa perda, é preciso fazer uma série de processos para reabilitar as funções dentárias normais. Então, quando há espaço na boca, é bom poder aproveitar esse terceiro molar, sem ter que fazer nada em termos de reabilitação”, pondera.

Já se tem optado pela chamada extração precoce, conforme explica Márcio Sayão, também professor da FO e um dos autores do livro Cirurgia dos dentes inclusos. “A extração precoce pode ocorrer quando, radiograficamente, observa-se a posição do siso e a relação do tamanho dos dentes com o tamanho da arcada, fazendo o diagnóstico de que não vai haver espaço para erupcionar”, explica. Esse tipo de procedimento pode ser feito por volta dos 16 anos, dependendo do caso.

Porangaba, que já extraiu dentes inclusos de pacientes com mais de 70 anos, alerta, se for necessária a extração, o melhor é fazê-lo o quanto antes. “Um rapaz novo tem o que chamamos de dilatação óssea. Um paciente com 50 anos não tem e vai ser necessário desgastar mais osso e deixar mais seqüela”, afirma.

O destino do siso

É consenso entre os especialistas que o terceiro molar tende a não ter mais espaço nas arcadas dentárias das próximas gerações. “Existe a teoria evolutiva de que o ser humano tende a perder o último dente de cada grupo. No caso do terceiro molar, parece estar se confirmando. É muito mais comum, hoje em dia, não ter o terceiro molar, ou não ter espaço, do que há 50 anos”, comenta a professora Groisman.

Também é consenso entre os professores de que é necessário o acompanhamento sistemático de um dentista, para evitar problemas. “Dor nenhuma é normal. É preciso procurar um dentista regularmente, até para o profissional poder avaliar, dizer se o processo está acontecendo e orientar o paciente a respeito da higienização para não chegar ao problema da dor”, aponta Sonia Groisman. “Às vezes a pessoa não tem o problema ainda, e só se dá conta quando ele está implementado. É possível prevenir antes que aconteça”, conclui a professora.