• Edição 112
  • 20 de dezembro de 2007

Ciência e Vida

Estudos e técnicas de Microcirurgia dos Nervos Periféricos

Cínthia Pascueto

Diariamente, hospitais atendem pacientes que sofreram os mais variados tipos de acidentes. Muitos podem provocar lesões nos nervos, órgãos responsáveis pela sensibilidade e função motora do indivíduo, acarretando conseqüências graves para sua saúde e bem-estar, uma vez que pode incapacitar o exercício de atividades costumeiras. No entanto, poucos sabem que há mais de uma década um grupo de estudos da Faculdade de Medicina da UFRJ e do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) desenvolve técnicas de microcirurgia dos nervos periféricos, atendendo tanto pacientes encaminhados por outras instituições de saúde quanto por aqueles que procuram o tratamento na própria Universidade.

O grupo de estudos continua a produção em pesquisa, desenvolvendo recentemente projetos de recuperação das lesões nervosas a partir de células-tronco. “Há aproximadamente seis meses, iniciamos um projeto de pesquisa pioneiro em nosso meio, de cirurgia experimental com animais, que visa estudar a regeneração do nervo a partir da interposição de células-tronco nas lesões. Esse é um estudo importante, que dará uma base para a aplicação desse mecanismo na recuperação motora, da sensibilidade e no tratamento da dor causada pela lesão nos pacientes”, afirma Flávio Freinkel, professor adjunto e coordenador da pós-graduação em cirurgia da Faculdade de Medicina da UFRJ.

As principais causas de lesões nos nervos são acidentes de trânsito, domésticos e por imperícia. “Uma das lesões não muito freqüentes, mas que devemos ressaltar, é provocada pela aplicação de injeções intramusculares profundas por não-profissionais. Nesses casos, pode ocorrer lesão do nervo ciático, quando aplicada nas nádegas, ou do nervo radial, no músculo deltóide (braço)”, explica o cirurgião.

Além da lesão do nervo pela agulha, há também a lesão química, pela injeção do medicamento. Outros tipos de lesões nervosas são provocados por quedas, materiais cortantes e armas, esta última apresenta incidência crescente. O professor destaca a imprudência no trânsito como a maior causa dessas lesões: “acidentes automobilísticos, principalmente aqueles provocados por motocicletas, atingem mais de 50% dos pacientes com seqüelas nervosas mais graves”, lamenta.

Sobre o atendimento no HUCFF, Freinkel conta que é feita uma triagem entre os pacientes que buscam o serviço e em seguida um protocolo analisando a lesão e selecionando a intervenção mais apropriada para submeter o paciente. “O objetivo é reconstruir a ligação nervosa e recuperar a função da parte afetada, lembrando que esses acidentes geralmente atingem os membros superiores e inferiores, tronco e pescoço”, conta o especialista, que completa: “As lesões mais graves e muito freqüentes são do plexo braquial, grupo de nervos responsável pela sensibilidade e motricidade dos membros superiores”, conceitua.

Flávio Freinkel explica que, neste último caso, de lesão no plexo braquial, “os nervos que partem da coluna e vão para os membros superiores são ‘arrancados’ da medula, havendo uma desconexão do membro superior em relação ao controle do cérebro. Não é possível ‘reunir’ esses nervos à medula. É utilizada então uma técnica cirúrgica de ponta chamada neurotização, em que os nervos dos membros superiores são reimplantados em outros nervos que formam uma via entre a medula e o cérebro”, descreve o professor.

O grupo de estudo também desenvolve tratamentos de lesões nervosas a partir de microcirurgias: “Quando há uma perda de parte de algum nervo em acidentes muito graves, é feito o transplante com a colocação de enxerto. É retirado do próprio acidentado, por exemplo, um nervo sensitivo do membro inferior e transplantado para o membro superior. Quando há a necessidade de outros enxertos, são utilizados trechos de veia do próprio paciente ou materiais biodegradáveis, para dar a direção ao crescimento e recuperação do nervo. Essa técnica não é utilizada apenas para lesões do plexo braquial”, expôs Freinkel.