• Edição 071
  • 08 de março de 2007

Argumento

Brincadeira tem que ter hora na vida da criança

Isabella Bonisolo - AgN Praia Vermelha

Bonecas, jogos, bola e blocos de montar. Ou você era do tipo que preferia pique-esconde, amarelinha e pipa? Não importa. O que essas e muitas outras brincadeiras fizeram por você, talvez seja muito mais do que você imagina. Através de atividades lúdicas, a criança tem a oportunidade de desenvolver-se em diversos planos: psicomotor, lingüístico, cognitivo, moral, afetivo, entre outros.

Nos primeiros 18 meses de vida, os jogos são de exercício. Os bebês, em movimentos repetidos, se auto-reconhecem. “As maiores aquisições da criança são obtidas através da brincadeira. Através disso, ela vai se conhecendo e se constituindo como sujeito humano. Quanto mais nova a criança, maior a necessidade de brincadeiras com movimento, para ela apreender o mundo exterior e os objetos no seu entorno”, declara Lílian Ulup, coordenadora técnica da Divisão de Psicologia Aplicada do Instituto de Psicologia da UFRJ.

A partir do 3º ano, os jogos simbólicos prevalecem. Cenas e imitações de situações em que os pequenos vivem, além de momentos de pura imaginação, servem como substitutos de vontades que não são supridas no dia a dia. Entre 7 e 11 anos os jogos com regras são os mais preferidos, o que proporciona o desenvolvimento moral das crianças.

- À medida que a criança cresce, as suas necessidades não são sempre atendidas de imediato. Em muitas dessas brincadeiras, as crianças conseguem sanar o que o adulto não pode ou quer dar - explica a psicóloga.

Lílian Ulup atenta ainda para os brinquedos que são disponibilizados para as crianças. Afirma que eles podem chegar a ter um nível de sofisticação que desinteressa e inibe a imaginação da criança. “Qual seria a papel ativo da criança? Ligar um botão? A brincadeira deve ser a imaginação em ação”, declara.

Infelizmente, em algumas regiões do país, ser criança não é necessariamente ter infância. Lílian revela que muitas começam a trabalhar a partir dos 8 anos, o que retira a prática de brincar de suas vidas.

Presença adulta nas brincadeiras é benéfica

Segundo uma pesquisa do Instituto Ipsos, que entrevistou cerca de mil pessoas, apenas 53% dos pais brincam com seus filhos diariamente. Para Lílian, a presença do adulto - ou até de uma criança mais velha - nesse momento, é fundamental.

- O papel do adulto na brincadeira com a criança é de construir significados para as situações, objetos e afetos. Tem um exemplo muito clássico na literatura, que é a situação de dois bebês de oito meses, sentados, brincando, enquanto uma professora os observa. Um deles, ao receber uma fralda, cobre o rosto, acidentalmente. A professora, dá um significado a aquele ato dizendo: “cadê?”. E, ao puxar o pano, fala: “achou!”. Aquilo, ao se repetir, cria uma situação lúdica em que o adulto serve de mediador entre o bebê e a cultura na qual ele está inserido - acredita a psicóloga.

A pesquisa ainda revela que somente 14% dos pais sentem prazer ao brincar com seus filhos. Lílian acredita que isso possa ser reflexo das novas relações familiares vigentes. “Os jovens estão casando-se mais velhos, pois optam por construir uma carreira profissional antes, e escolhem ter apenas um filho, muitas famílias são desfeitas, com o divórcio, as mulheres não ficam mais em casa, elas trabalham, entre outros. Os pais têm muito menos tempo para ficar com seus filhos.”

Outro dado assustador é a resposta de 97% das crianças, que afirmam que ver televisão é seu passatempo favorito. Lílian Ulup defende que ver TV não é ruim, mas deve ser uma atividade com tempo limitado e acompanhada pelos pais, para que haja interação. “Independente do conteúdo veiculado, não é bom que a criança passe um número muito grande de horas sentada. A parte do psiquismo está muito ligada à motricidade. Ela precisa se movimentar”, conclui.