• Edição 050
  • 24 de agosto de 2006

Argumento

Poderosa, mas perigosa

Isabella Bonisolo

A soja é considerada um alimento funcional, ou seja, possui nutrientes que são benéficos ao organismo. Apesar da boa contribuição que essa leguminosa pode nos trazer, em alguns casos, ela pode se tornar uma vilã para o corpo, ocasionando sensações desagradáveis, como flatulência.

O trunfo, que conferiu status de “alimento da moda” para a leguminosa milenar, é a Isoflavona. Há uma lista de benefícios que essa substância é capaz de trazer, como por exemplo, o auxílio no tratamento de reposição hormonal. É graças a essa descoberta que mulheres com menopausa ou perimenopausa estão ingerindo soja, que é rica em isoflavonas, um hormônio natural que compensaria as baixas taxas de estrogênio desse período.

Estudos na Universidade de Purdue, EUA, concluíram que em animais, as proteínas e as isoflavonas da soja alteram beneficamente o metabolismo do cálcio para a formação óssea e, além disso, apresentam um efeito protetor contra as perdas de cálcio do organismo. Experimentos com humanos estão sendo encaminhados, mas o que tudo indica, é que a soja é alimento chave para quem tem osteoporose.

 E as qualidades da leguminosa não param por aí. De acordo com a professora do Departamento de Nutrição Básica Experimental da Faculdade de Nutrição da UFRJ, Eliane Fialho, os valores lipidêmicos cardiovasculares diminuem com a ingestão da soja, o que significa um coração livre do temido colesterol alto, o LDL.

Como tudo o que é muito bom sempre tem seu lado negativo, seria ilusão acreditar que a soja ficaria fora dessa. “A soja, como qualquer outra leguminosa, apresenta o que se chama de antinutrientes ou fatores antinutricionais. Há algumas substâncias presentes, como fitatos, inibidores de enzimas digestivas de proteases que acabam levando a uma pior digestão protéica e a alteração ou até inibição de secreções do trato gastrintestinal, como a das enzimas proteolíticas que atuam degradando as proteínas. Isso pode gerar várias complicações”, explica Eliane.

Além de poder gerar uma digestão de alimentos comprometida, a soja ainda possui o efeito quelante (“seqüestrador”) de alguns minerais importantes para o nosso corpo. Porém, isso somente acontecerá se houver a ingestão de soja crua. “Normalmente esses fatores torna-se inativos com o calor. Quando ingerimos a soja, não o fazemos crua. Cozida, não há problema”, esclarece a professora.

Infelizmente, há um desconforto provocado pela soja que não pode ser evitado. Certos tipos de açúcares que ela possui não são degradados pelo organismo humano e eles acabam fermentando no intestino, gerando flatulência. Eliana Fialho conta que “muitas pessoas que consomem soja relatam isso, que é completamente normal”.

Quando questionada sobre a possibilidade do desenvolvimento de um câncer pela ingestão de soja, tópico que gera dúvidas em muita gente que não sabe o que é verdade ou mito sobre os efeitos gerados, a professora especializada em alimentos funcionais foi incisiva em seu discurso: “as isoflavonas, principalmente a genisteína, inibem especificadamente uma enzima, que se chama tirosina quinase, que está muito envolvida nos processos de câncer e diferenciação celular. Isso já está demonstrado cientificamente. Alguns ensaios clínicos já estão até utilizando a genisteína como auxiliar em terapias para o câncer”.

Algo importante que se deve ter em mente é que não será apenas o uso indiscriminado da soja que trará todos os benefícios citados acima. Para aproveitar tudo de bom que esse poço de isoflavonas pode oferecer, um funcionamento intestinal regulado é fundamental. “As formas das isoflavonas presentes no alimento não são aquelas que serão absorvidas e terão atividade biológica. Elas precisam ser metabolizadas pela nossa microflora intestinal. Se há situações de desbiose intestinal, você acaba não tendo uma boa absorção e aí não dá efeito nenhum. Você ingere a soja à toa”, conclui a professora.