• Edição 047
  • 03 de agosto de 2006

Ciência e Vida

Esclerose múltipla: desacelerando a vida

Mariana Elia

Velocidade, capacitação, modernização. A sociedade ocidental cultua a agilidade, a jovialidade e não abre mais espaço para o que exige calma ou paciência. Nesse ambiente, torna-se difícil aceitar doenças degenerativas, que podem invalidar o doente ou, pelo menos, exigir uma desaceleração de sua vida cotidiana. A esclerose múltipla (EM) é um exemplo dessas doenças e merece cada vez mais atenção, já que afeta mais de 35 mil brasileiros entre os 20 e 40 anos de idade.

- A EM é uma doença do Sistema Nervoso Central (SNC) que se caracteriza por um processo inflamatório recorrente, atacando a bainha de mielina nas fibras nervosas, os chamados axônios. As demais estruturas do SNC são relativamente preservadas - ensina o neurologista e professor Maurice Vincent, do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFRJ. A universidade oferece, pelo Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), um serviço especializado na doença, que é coordernado pela médica Soniza Leon.

A bainha de mielina é uma estrutura gordurosa que permite melhor condutibilidade das informações de um neurônio para outro, aumentando o potencial de ação dos mesmos. A desmielinização causa lesões no tecido, as quais alguns médicos chamam de placas, devido à sua forma bem delimitada, e figuram-se no surgimento de alguns sinais neurológicos.

Os primeiros sintomas designam distúrbios visuais, acometimento das funções motoras e fraqueza. O equilíbrio e a faculdade da linguagem também podem ser prejudicados. Para Maurice Vicent os sintomas variam conforme a região onde a doença se instala. “Caracteristicamente, o paciente apresenta crises ou surtos intercalados por períodos total ou parcialmente normais. A gravidade varia entre os pacientes, mas há muitas pessoas que apresentam apenas deficiências muito leves e vivem normalmente. Já outras apresentam anormalidades que interferem na sua rotina”, explica o professor.

A EM tem um quadro particular. Segundo o professor, não existe exame que seja definitivamente comprovador, o diagnóstico é feito por evidências clínicas, histórico do paciente e exames complementares, como a ressonância magnética e o exame do líquido céfalo-raquidiano. Além disso, a progressão é imprevisível e as causas ainda são pouco evidentes. “Existem medicamentos que podem reduzir a ocorrência de surtos no futuro, mas não há remédios que eliminem completamente a possibilidade de novos surtos”, diz o professor para quem há uma predisposição genética, ainda que não seja determinante.

Outra característica da EM é sua propriedade imunológica. Estudos indicam que a inflamação se inicia por reação contra a própria mielina, sendo portanto uma doença auto-imune. Assim, a EM, com causas desconhecidas, diagnóstico difícil, sintomas variados e evolução imprevisível, requer do paciente paciência e atenção ao tratamento, que é baseado em medicamentos para momentos de crise e para diminuir as chances da mesma. Maurice Vicent diz que o apoio de familiares e amigos é fundamental, principalmente quando a doença está avançada e o indivíduo fica incapacitado para realizar suas atividades cotidianas.