• Edição 044
  • 13 de julho de 2006

Argumento

As diversas metas de aprendizagem

Pesquisador da UFRJ explica como alunos e professores podem maximizar a relação ensino-aprendizagem

Taisa Gamboa

Interagir com o mundo, compreendê-lo, criar relações e produzir. Estas são características comuns aos seres humanos, e desenvolvem um papel fundamental ao longo da vida de cada pessoa. O processo de aprendizagem tem vital importância nessa questão por ser o principal meio de crescimento intelectual de transformação pessoal e social.

A aprendizagem pode ser analisada segundo três grandes escolas, a behaviorista, a neobehaviorista e a cognitivista. Enquanto a primeira analisa a aprendizagem a partir do comportamento observável pela relação estímulo resposta; e a segunda se interessa pelo processo de aprendizagem do ponto de vista do comportamento observável, da organização das variáveis que modula a relação entre estímulo e resposta; a terceira escola analisa o aprendizado através da análise do processo de aprendizagem, das diferentes formas como o aluno pode absorver as informações, seleciona-las e armazena-las.

Segundo o professor Maurício Peixoto, coordenador do Grupo de Aprendizagem e Cognição (GEAC) do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde (NUTES) da UFRJ, a aprendizagem engloba o recebimento de informações, sua transformação mediante pontos de vista particulares e a produção de algo útil para quem produz ou para outros. Todo mundo aprende com um determinado objetivo e dentro de certos limites a aprendizagem pode ser uma atividade planejada.

Existem pessoas que aprendem de forma inconsciente, outras precisam de uma atividade prática, e para algumas apenas a análise de textos pode ser eficaz. Com o objetivo de ajudar as pessoas a aprenderem mais eficientemente, o GEAC procura, desde 1998, investigar o processo de aprendizagem no ser humano. Os recortes de interesse incluem a metacognição, motivação, hábitos e fontes de estudo, formas de raciocínio, interação social e estratégias de aprendizagem.

A partir do enfoque fenomenológico, o grupo estabelece as diretrizes de aprendizagem existentes em cada grupo acadêmico. “Estamos preocupados com significados mais individuais. Nos casos que estudamos dentro da UFRJ, o processo de aprendizagem está intimamente relacionado com as significações que cada aluno estabelece ao longo de sua vida acadêmica. E por isso é que faz sentido trabalharmos em termos meta-cognitivos”, analisa o professor Maurício Peixoto.

De acordo com o pesquisador da UFRJ, a cognição é relativa ao ato de conhecer. A forma como cada pessoa seleciona, anota e estuda as informações que recebe durante uma aula são dados cognitivos e pessoais. Mas a análise e o planejamento adequado dessas atividades são atuações meta-cognitiva. A psicologia diferencial é utilizada nas análises do GEAC a partir do preceito de que um indivíduo se torna diferente conforme o que aprende. Além disso, a teoria das inteligências múltiplas também é empregada nos estudos sob os estilos de aprendizagem. A cognição está relacionada ao processamento onde predominam os elementos de natureza intelectual tais como percepção, o raciocínio, a atenção, a memória e a generalização. Para os teóricos cognitivistas, a essência do que se aprende está dentro de cada pessoa e, sendo um acontecimento reservado, só se conhecerá o que cada um aprendeu quando este agir e reagir em conformidade com o novo estado mental.

A partir de um grupo de alunos internos de medicina, a equipe do professor Peixoto conseguiu identificar cerca de 50 tipos diferentes de aprendizagem. Na universidade, o aluno passa a ter que lidar com um tipo de ensino ao qual não estava acostumado. Enquanto, no ensino secundário, o trabalho presencial do professor, do livro e do quadro negro são a tônica, no terceiro grau, o sistema educacional é virtual. O aluno passa a ter que lidar com um ensino a distância, onde recebe apenas as diretrizes para o aprendizado, mas ele mantém a sua perspectiva e hábitos de estudo do ensino presencial, o que gera problemas de adaptação e aprendizagem. A partir dessa análise é possível identificar erros de raciocínio das teorias e práticas ensinadas. Para contornar o problema, cada aluno estabelece, a partir da sua própria experiência, um método de aprendizagem particular e, muitas vezes, inconsciente.

Um estudo similar foi realizado com alunos de enfermagem analisando a relação entre os conhecimentos prévios e a forma de aprendizagem. O conteúdo previamente detido pelo indivíduo representa um forte influenciador do processo. Novos dados são assimilados e armazenados na razão direta da qualidade da estrutura cognitiva prévia do aprendiz. Esse conhecimento anterior resultará num "ponto de ancoragem" onde as novas informações irão encontrar um modo de se integrar a aquilo que o indivíduo já conhece.

Dependendo das crenças que cada pessoa tem, a enfermagem, no caso, pode ser entendida como uma arte, uma ciência ou uma prática. E essa crença epistemológica interfere na forma como cada um aprende o ofício e suas principais bases, apresentando efeitos concretos no dia-a-dia da ação. Essa experiência cognitiva, porém, não influencia-se apenas unilateralmente. Apesar da estrutura prévia orientar o modo de assimilação de novos dados, estes também influenciam o conteúdo atributivo do conhecimento já armazenado, resultando numa interação evolutiva entre "novos" e "velhos" dados. Esse processo de associação de informações interrelacionadas denomina-se aprendizagem significativa.

Em contrapartida, alguns estudos também mencionam a aprendizagem mecânica, que encontra muito pouca ou nenhuma informação prévia na estrutura cognitiva a qual possa se relacionar, sendo então armazenada de maneira arbitrária. Em geral envolve conceitos com um alto ou total teor de "novidade" para o aprendiz, mas no momento em que é mecanicamente assimilada, passa a se integrar ou criar novas estruturas cognitivas.

Muitas vezes um indivíduo pode aprender algo mecanicamente e só mais tarde percebe que este se relaciona com algum conhecimento anterior já dominado. Um esforço e tempo demasiados foram gastos para assimilar conceitos que seriam mais facilmente compreendidos se encontrassem uma "âncora" existente na estrutura cognitiva. A aprendizagem mecânica é necessária e inevitável no caso de conceitos inteiramente novos para o aprendiz, mas posteriormente ela passará a se transformar em significativa. Para acelerar esse processo alguns organizadores prévios e âncoras podem ser criadas a fim de manipular a estrutura cognitiva, interligando conceitos aparentemente não relacionáveis através da abstração.

A aprendizagem cognitiva proporciona vantagens tanto para alunos como para professores. O estudante consegue gerenciar melhor o seu processo de aprendizagem, ampliando sua capacidade de absorção do que lhe é transmitido. O professor, por sua vez, estabelece métodos de análise do aluno e estratégias de ensino que lhe permitam maximizar o ensino, através da organização do pensamento do estudante com conhecimentos meta-cognitivos do aprendizado e suas ferramentas.